20 mar Unicamp Empreendedora
Por Sarah Schmidt
Em uma terça-feira à noite, alunos com idades entre 20 e 60 anos assistiam a uma palestra sobre técnicas de pitch e storytelling para startups em uma sala de aula do Ciclo Básico II, na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Na apresentação, eram expostos temas como os passos para realizar uma boa apresentação de um projeto, como gerar engajamento, clareza e concisão para convencer um investidor, entre outros pontos. A aula faz parte da disciplina eletiva “Propriedade Intelectual, Inovação e Empreendedorismo: Temas Contemporâneos (AM037)”, uma das 22 disciplinas sobre empreendedorismo inovação que a Unicamp oferece nos campi de Barão Geraldo e de Limeira.
A oferta de cursos de empreendedorismo e inovação faz parte de um movimento da Universidade de se tornar cada vez mais empreendedora, seja pelo estímulo a docentes para que se capacitem e tragam estas temáticas para suas aulas regulares, seja pelo apoio a alunos para que considerem o empreendedorismo como opção de carreira. “Inovação e empreendedorismo são conceitos complementares. Muito embora exista empreendedorismo sem inovação, o que estimulamos na Unicamp é o empreendedorismo a partir do conhecimento e das experiências que os alunos tenham tido na Universidade, fomentado em competições de empreendedorismo (o Desafio Unicamp, por exemplo) e em disciplinas com esse enfoque. Nesse contexto entram as startups de base tecnológica e também todo um rol de empresas baseadas em criatividade”, comenta o professor Newton Frateschi, diretor-executivo da Agência de Inovação Inova Unicamp.
A Agência está realizando um mapeamento, a partir do nome das disciplinas e das ementas, para dar maior visibilidade a esse movimento na Unicamp, bem como identifi car quais áreas têm potencial, mas ainda não dispõem de disciplinas implementadas. “Podemos, a partir deste levantamento, pensar em como a Inova pode apoiar os docentes a levarem esses conceitos para seus alunos e atuar mais fortemente junto aos grupos nos quais esses temas ainda estão incipientes”, avalia o diretor. A ideia é que o levantamento seja feito semestralmente.
Dez das 22 disciplinas mapeadas até o momento são oferecidas pela Faculdade de Ciências Aplicadas da Unicamp (FCA) e quatro são oferecidas pela Faculdade de Tecnologia (FT), ambas do campus de Limeira. Outras Unidades como o Instituto de Biologia (IB), o Instituto de Geociências (IG), o Instituto de Química (IQ) e a Faculdade de Educação (FE) também oferecem disciplinas que já foram mapeadas. Os conteúdos incluem temas como cultura da inovação e da criatividade, o conceito de planejamento para empreender e ferramentas, como modelos de negócios, canvas e gestão ágil.
Embora 22 disciplinas já seja um número bastante relevante, Mariana Zanatta, gerente da Incamp (Incubadora de Empresas de Base Tecnológica da Unicamp) e do Parque Científi co e Tecnológico da Unicamp, ressalta que o levantamento não é exaustivo. “Sabemos que outras disciplinas, que não são exclusivamente sobre inovação e empreendedorismo, também abordam os temas, incorporando a temática ao currículo regular. Por isso, estimamos que mais alunos tenham contato com esses conhecimentos na Universidade”, explica Zanatta
Esse é o caso da Disciplina EQ883 – Bioengenharia 2, ministrada pela professora Angela Maria Moraes da Faculdade de Engenharia Química da Unicamp (FEQ). No ano de 2015, a Inova fez um convite para o professor Erik Sander, da Universidade da Flórida, para um treinamento sobre empreendedorismo acadêmico, o qual Moraes foi uma das docentes que participou e incorporou os conceitos em sua disciplina. Na EQ883, os alunos fazem um projeto durante o semestre inteiro, pensando em um produto, no mercado, nos fornecedores e em como vendem e se relacionam com o consumidor. “Nós precisávamos ter os conceitos de inovação e empreendedorismo de uma forma mais clara. Nós incorporamos esses elementos de maneira a ir além do conteúdo da sala de aula. Isso também vai de encontro com o que os alunos querem em termos de experiência e excelente para consolidar os conceitos”, avalia a docente.
O professor Orlando Fontes Lima Júnior, da Faculdade de Engenharia Civil, Arquitetura e Urbanismo, coordena a disciplina “Gestão da Inovação e do Conhecimento (ECO-0066), também compartilha a refl exão de que é fundamental que os temas da inovação e do empreendedorismo não sejam abordados apenas em disciplinas específi cas: “Eles devem ser trabalhados transversalmente dentro dos cursos nas diferentes disciplinas. A melhor maneira para se desenvolver uma atitude não é consolidando um conjunto de conteúdos, mas sim incorporando essa dimensão nos conteúdos ensinados”.
Disciplinas conectadas com o mercado
Das disciplinas de graduação e pós-graduação mapeadas, cinco são obrigatórias. É o caso da “Empreendedorismo (MG900)”, da Faculdade de Ciências Aplicadas (FCA), obrigatória no curso de Administração e ministrada pelo professor Edmundo Inácio Júnior. “Essa disciplina tem um duplo propósito: por um lado, permite aos alunos ter uma imersão no mundo do empreendedorismo por meio da elaboração de um modelo de negócios com conteúdo inovador; por outro lado, também é abordada como ciência e campo de estudo”, esclarece.
Ele ressalta que os alunos têm contato com técnicas contemporâneas, como business model canvas, design thinking, value proposition canvas e lean startup, além de conceitos como effectuation, ecossistemas, políticas públicas para fomento e estatísticas da atividade empreendedora. Nas aulas também são usados vídeos e são convidados palestrantes externos.
Para o docente, as disciplinas de empreendedorismo e inovação permitem que os alunos enxerguem o empreendedorismo como mais uma oportunidade profissional. Ele destaca que isso faz com que eles percebam que “na Unicamp há vários recursos – estruturas, editais, treinamentos, órgãos como a Incubadora, o Parque Tecnológico, a Agência de Inovação – que auxiliam o estudante, seja de Graduação ou Pós-Graduação, a perseguir essa trajetória”.
Por exemplo, na disciplina “Propriedade Intelectual, Inovação e Empreendedorismo: Temas Contemporâneos (AM037)”, o formato é dinâmico, inspirado em modelos vistos no exterior, com palestras práticas que também trazem assuntos atuais do mercado. “Mas não é só ouvir, tem a parte de mão na massa também”, conta o professor Newton Frateschi. Alguns dos temas abordados nas palestras e aulas práticas detalham como construir uma equipe, como proteger seu produto ou serviço e como elaborar e validar modelos de negócios, por exemplo.
O empreendedorismo como visão de mundo
As disciplinas oferecidas passam por diversas áreas do conhecimento, como em ciências da vida, educação, economia, administração, tecnologia entre outros. O perfi l dos alunos também é variado, como observado na aula da disciplina “Propriedade Intelectual, Inovação e Empreendedorismo: Temas Contemporâneos” (AM037), oferecida pela Inova Unicamp e citada no começo desta reportagem. A estudante de engenharia química Luana Araújo, de 22 anos, é uma das matriculadas nela. “Confesso que não sabia da existência dessa matéria, mas acabei descobrindo ao procurar opções de eletivas. Fico impressionada com a qualidade das palestras, porque o empreendedorismo é um sonho para mim. Aqui, já estou aprendendo como é o caminho, estou dando os primeiros passos”, planeja.
A representante comercial Liliane Geraldi, de 61 anos, é uma das matriculadas pelo Programa UniversIDADE e elogia a experiência: “Apesar de eu já ser empreendedora, estou aprendendo novos conceitos e percebo que esse assunto ainda é algo novo para mim”. Por sua vez, a bibliotecária e pedagoga Marinês de Campos Ribeiro, de 60 anos, também aluna do UniversIDADE, está investindo em um negócio próprio. “Aprendi que empreendedorismo não é só você decidir que vai montar algo e pronto. Precisa ter um passo a passo, um plano de ação. Estou colocando os ensinamentos em prática”, afirma.
Outro aluno da disciplina é Vitor Anunciato, de 29 anos, estudante de educação física que busca desenvolver suas potencialidades: “Decidi cursar essa disciplina por curiosidade e por uma vontade de agregar informações para o meu autoconhecimento, para que eu possa mapear melhor quais áreas devo me aprofundar, em qual direção devo ir. Quero conhecer melhor como esse mercado privado funciona e ver como vou lidar com ele e me desenvolver”, analisa.
Para o professor Newton Frateschi, docente responsável pela disciplina AM037, é esperado que o perfil dos alunos seja heterogêneo. “Independente do momento profissional em que a pessoa esteja, a educação empreendedora é fundamental. O intraempreendedorismo, por exemplo, é uma habilidade que as empresas vêm buscando em seus profissionais. É importante para que tenham acesso ao mercado de trabalho em geral, com impacto positivo em suas vidas pessoais”, comenta.
O professor Edmundo Inácio Júnior da FCA compartilha da mesma linha de pensamento. Para ele, a cultura empreendedora é abrangente. “Não se trata só de empregabilidade ou de modismos como dinheiro rápido e fama, mas de um alinhamento entre vocações: o que eu faço de melhor, o que eu sou/quero ser, o que eu mais gosto, como as oportunidades são percebidas no ambiente, no que posso ajudar a transformar o mundo”. Ele ainda finaliza: “Seja abrindo sua própria empresa ou atuando em uma empresa de terceiros, a postura que marca o comportamento empreendedor é seu mindset, ou seja, a forma como percebe e lida com o mundo”.