Empresa-filha da Unicamp recebe R$ 500 mil para desenvolver teste rápido contra a Covid-19

Ana Paula Palazi

A BIOinFOOD, empresa-filha da Unicamp, foi selecionada no Programa de Subvenção Econômica à Inovação, lançado pela FINEP, financiadora de inovação e pesquisa do Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTIC). Em parceria com o Laboratório de Genômica e bioEnergia (LGE), da Unicamp, a startup vai desenvolver o protótipo do novo modelo de teste rápido que usa leveduras para o diagnóstico da Covid-19, chamado CoronaYeast.

A startup foi uma das 59 classificadas no edital lançado em maio, concorrendo com grandes empresas farmacêuticas e de tecnologia, num universo de 300 inscrições. A seleção pública concedia até 120 milhões de reais em recursos não reembolsáveis (dinheiro que não precisa ser devolvido) do Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT) para impulsionar soluções inovadoras com foco no combate à pandemia.

No início do mês, a BIOinFOOD – que até então trabalhava com leveduras personalizadas para a indústria de panificação, nutrição animal e bebidas – teve o valor de 500 mil reais aprovado. Ela tem até 12 meses para transformar o conceito científico do biossensor, criado e patenteado na Unicamp, num produto comercial. Em contrapartida, a empresa deve investir um percentual mínimo de 10% do valor aprovado. A parceria com a universidade foi firmada com apoio da Inova num contrato de licenciamento não-exclusivo.

Para encarar o desafio, a equipe formada por três ex-alunos passou pelo programa InovAtiva, o maior acelerador de startups da América Latina, do Ministério da Economia. “Nascemos para atuar na área de alimentos e bebidas, mas nossa expertise em modificar leveduras não fica delimitada a isso, porque o microrganismo é o mesmo, as técnicas de manipulação genética são as mesmas, o que muda é só a aplicação”, explica Osmar Carvalho Netto, cofundador da BIOinFOOD.

A startup, criada em 2018, ainda vai contratar mais dois cientistas para trabalharem exclusivamente no desenvolvimento do dispositivo que será produzido, inicialmente, em impressoras 3D; e finaliza a montagem de um laboratório próprio no Polo II de Alta Tecnologia de Campinas, também financiado com recursos públicos do Programa Pesquisa Inovativa em Pequenas Empresas (PIPE), da FAPESP.

Para o coordenador do Laboratório de Genômica e bioEnergia Gonçalo Amarante Guimarães Pereira, o Brasil é um grande produtor de ciência, mas ainda precisa avançar para ser um player importante em inovação, pois não basta criar tecnologias, é preciso transformá-las em produtos para o mercado. A saída, segundo ele, é empresariar um conceito, como já fazem outras universidades no exterior. Nestes casos, os docentes se envolvem na formação de novas empresas spin-off, que vão ser unidades para o desenvolvimento de uma ideia até o produto. “É uma disrupção, estamos falando de uma ideia protegida por patente”, explica o professor.

O docente reforça que o amadurecimento deste tipo de tecnologia disruptiva em cooperação com uma startup só é possível porque já houve o investimento público em material permanente, como a construção de laboratórios e a aquisição de equipamentos de alta tecnologia. No caso desta parceria, a estrutura da Unicamp, com a força-tarefa contra a Covid-19, será usada para os primeiros testes em escala piloto. Assim, os pesquisadores conseguem coletar informações para melhorar o dispositivo, ao mesmo tempo em que o biossensor é formatado.

A presença de investimento semente – como o da FINEP – também é outro fator destacado por Gonçalo para ampliar a possibilidade de transformar uma tecnologia em inovação, pois ele permite que se alcance outros estágios de desenvolvimento para aumentar o interesse de investidores maiores. No caso desta tecnologia em específico, o docente explica que uma grande empresa de cerveja já se mostrou interessada na produção da levedura e outros dois potenciais investidores também sinalizaram que estão abertos ao diálogo.

Os próximos passos da parceria

Os pesquisadores da Unicamp serão responsáveis pela criação da nova cepa, a partir da família de leveduras mais comum, a Saccharomyces cerevisiae, usada na produção de pães, cerveja e etanol. Os inventores da patente Fellipe da Silveira Bezerra de Mello e Carla Maneira da Silva explicam que vão incluir um gene repórter no microrganismo que muda de cor quando entra em contato com o coronavírus. A ideia é que as pessoas possam fazer o teste em casa de forma segura, se necessário várias vezes na semana, a partir da coleta de amostras de saliva e, também, para detecção de contaminação em superfícies.

A principal vantagem do biossensor sobre o atual teste RT-PCR é o custo baixo de produção do insumo. Em condições ideais esses microrganismos se multiplicam rapidamente. Além disso, o novo kit tem autonomia em relação ao uso de reagentes. “É como um teste de gravidez que se compra na farmácia, você não precisa de nada complementar para fazer diagnóstico”, compara Osmar.

O valor ainda não foi estimado, mas a expectativa é de que o biossensor seja até 100 vezes mais barato. Se a teoria se confirmar nos próximos meses, o processo poderá ser flexibilizado para a detecção de outras doenças. “É uma plataforma tecnológica sem competição do ponto de vista de custo e simplicidade, ainda assim, estamos falando de um mercado de milhões de dólares porque, infelizmente, esse não será o nosso último vírus”, finaliza Gonçalo.

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