Correio Popular | Unicamp ajuda a desenvolver robô capaz de plantar flores

Braço robótico em cores branco e cinza é apresentado em feira de exposições. Fim da descrição.
Convênio de pesquisa para desenvolvimento da tecnologia foi negociado com suporte da Inova Unicamp

Texto: Edimarcio A. Monteiro/RAC | Foto: Divulgação

A Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) desenvolve uma pesquisa inédita no mundo de uso de robô para a automação na produção de flores. O cobot ou robô colaborativo, criado para interagir com humanos em ambientes de trabalho, é equipado com sistema de visão 3D e utilizado para fazer o plantio de mudas e o controle fitossanitário, uma das principais preocupações do setor, que é oferecer ao mercado produtos livres de doenças e pragas.

“Um dos principais desafios agora é validarmos o quanto antes o projeto-piloto”, explica o professor de Projetos de Máquinas e Robótica na Agricultura da Faculdade de Engenharia Agrícola (Feagri) da Unicamp, Daniel Albiero. O uso de robôs na produção de flores já ocorre na Europa, em países como Holanda, França e Inglaterra, mas é basicamente para o transporte. O ineditismo da nova pesquisa é o uso já a partir do plantio. O cobot que está sendo testado foi lançado por uma multinacional suíça-sueca em 2021, mas que até o momento tem aplicação na indústria, seja na manutenção de máquinas, linha de montagem, almoxarifado e aparafusamento, mas pode ganhar novas aplicações.

O projeto-piloto envolve a Unicamp e duas empresas. A universidade é responsável pelo desenvolvimento do software específico para atuação do robô, diagnósticos e ferramenta terminal. A empresa fabricante fornece o robô colaborativo. A validação do projeto-piloto é desenvolvido com a participação de uma produtora de mudas de flores e plantas de Atibaia (SP), que financia a pesquisa e é grande fornecedora nacional, com produção de 8,5 milhões de unidades por mês.

O uso da alta tecnologia não é exatamente uma novidade nesse segmento agroindustrial brasileiro. Ela está representada no uso da genética no desenvolvimento de novas variedades e aprimoramento das já existentes e também no controle do ambiente de produção. O introdução do robô colaborativo terá a missão de qualificar ainda mais o processo produtivo. Em 2021, o setor faturou R$ 10,9 bilhões, 15% a mais do que no ano anterior, de acordo com o Instituto Brasileiro de Floricultura (Ibraflor). São cerca de 8 mil produtores, que cultivam 2,5 mil espécies e geram 209 mil empregos diretos.

Etapas

Segundo Albiero, os resultados do protótipo usado na pesquisa devem sair já no próximo mês, o que indicará os refinamentos necessários e os próximos passos do projeto-piloto. A previsão e que a pesquisa seja concluída entre o final deste ano e março de 2024, apontando a viabilidade da solução ser aplicada em larga escala. O uso do cobot deverá criar uma linha de produção nos viveiros, com a mão de obra humana ficando encarregada apenas de abastecer a esteira com as bandejas com substrato (terra ou material orgânico) e a posterior retirada após o robô colaborativo fazer o plantio.

O equipamento é essencialmente um braço mecânico fixo, formado por quatro peças, com 95 centímetros de altura e 28 quilos de peso. É capaz de carregar até 5 quilos e fazer um giro de 180 graus. A pesquisa em andamento busca dotá-lo da delicadeza necessária para lidar com as mudas de flores e plantas, seres vivos sensíveis e pequenos. É um cenário muito diferente dos robôs usados hoje na agricultura, principalmente na operação de campo, através do uso de semeadoras, tratores e colheitadeiras automatizadas.

De acordo com o professor da Feagri, o novo cobot tem potencial para aumentar a produtividade, trabalhando 24 horas por dia. Também contribuirá para reduzir os custos do setor, cortando pela metade o número de pessoas envolvidas no plantio. O pesquisador descarta, porém, o risco de geração de um problema social decorrente do corte de empregos na agricultura. “É preciso deixar claro que isso não é uma tragédia social. Todo o produtor de flores e frutas tem dificuldade para achar mão de obra para trabalhar. A sociedade não quer mais esse tipo de trabalho”, justifica Albiero.

O censo revela que a população rural brasileira perdeu 2 milhões de pessoas entre 2000 e 2010. Esse contingente é equivalente a uma vez e meia a população de Campinas. Atualmente, a população rural é calculada em 29,8 milhões de pessoas, o que representa 15,6% do total do país. Na década de 1940, a participação era de 69%.

Trabalho qualificado

A operação do robô colaborativo exige apenas a atuação de um técnico treinado, seja da área agrícola ou da mecatrônica, que fica encarregado de fazer a programação e a manutenção. O projeto-piloto é desenvolvido em um ambiente controlado: um viveiro coberto e cercado de cerca de 1 hectare da empresa de Atibaia. Por envolver questões de segredo industrial, outros detalhes sobre o desenvolvimento da nova tecnologia e a estratégia de mercado são mantidos em sigilo.

“Quando o projeto for concluído, esperamos que todo o processo seja automatizado. Isso permitirá que a produção ocorra dia e noite, sem feriado”, afirma o diretor da companhia, Olimar Nunes do Amaral. A Unicamp e a produtora de mudas já mantêm parcerias em outros trabalhos de desenvolvimento de soluções para automatização de processos, como no sistema de ventilação das estufas de produção, que é controlado por software.

A nova pesquisa tem a participação de professores, pesquisadores e alunos de graduação e pós-graduação da Feagri. Segundo Albiero, que coordena o trabalho, um dos destaques tecnológicos é o desenvolvimento de um novo sistema de visão 3D, que permitirá ao robô identificar os itens que serão manipulados, além de realizar diagnósticos fitotécnicos que poderão ser facilmente programados.

Outra vantagem do cobot é evitar que os trabalhadores realizem tarefas repetitivas e ergonomicamente problemática. De acordo com a fabricante, o robô colaborativo pode ser operado poucos minutos após a instalação, de maneira intuitiva. Os dados mostram que o uso desse tipo de equipamento está em franca expansão do mundo.

De acordo com a Federação Internacional de Robótica (IRF, na sigla em inglês), organização profissional que promove o setor, em 2021 o número de robôs colaborativos recém-implantados cresceu 50%, chegando ao total de 38.966 unidades. Eles representam 7,5% do total de 517.385 robôs industriais instalados ao redor do mundo. Em 2017, quando a entidade iniciou as estatísticas de cobots, a participação no mercado era de 2,8%.

Mercado

Segundo uma pesquisa da Kenneth Research, espera-se que o mercado global de robôs agrícolas se desenvolva a uma taxa de crescimento anual de 21,1% até 2024. Em 2016, ele foi estimado em US$ 3,2 bilhões (R$ 16,78 bilhões), número que praticamente dobrou em cinco anos. Em 2021, atingiu os US$ 6,3 bilhões (R$ 33,03 bilhões). A expectativa é que chegará aos US$ 17,8 bilhões (R$ 93,34 bilhões) até 2027.

A utilização da robótica poderá ajudar a impulsionar o mercado de flores e plantas do Brasil, que tem uma participação modesta no cenário internacional, ficando em torno de 1% do total, o que coloca o país na 32º lugar no ranking. De acordo com o Ibraflor, São Paulo é o maior Estado produtor de flores e plantas, além de ser o maior consumidor.

Entre janeiro e julho de 2022, o Brasil exportou US$ 7,1 milhões (R$ 37,23 milhões) em produtos de floricultura, sendo a maior parte de mudas de plantas ornamentais, com participação de US$ 2,9 milhões (R$ 15,2 milhões), o equivalente a 40,8% do faturamento. Holanda, Estados Unidos e Itália são os principais destinos dos produtos nacionais.

Texto original publicado em Correio Popular.

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