PIPE faz pesquisa gerar bens e serviços para a sociedade, avalia Sérgio Salles-Filho

Programa completou 20 anos e teve dados analisados por pesquisadores da Unicamp

Carolina Octaviano

Inovação como a geração de novos produtos, processos e serviços, em benefício da sociedade. Este é um dos principais resultados gerados pelo Pesquisa Inovativa em Pequenas Empresas (PIPE) da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) – que completou 20 anos de existência -, conforme pontua o Professor Sérgio Salles-Filho, do Departamento de Política Científica e Tecnológica (DPCT) da Unicamp, responsável pelo estudo que analisou os impactos do PIPE. Ao longo desses anos, o Programa apoiou 1.788 projetos, com um investimento de mais de R$ 360 milhões.

Num primeiro momento, o estudo realizado avaliou 214 projetos desenvolvidos entre 1997 e 2006. A partir de 2017 será conduzido um novo estudo sobre o Programa, com base em dados coletados diretamente com as empresas beneficiadas pelo PIPE. Esta nova etapa de avaliação levará em consideração os projetos apoiados entre 2008 e 2016.

Na entrevista abaixo, Salles-Filho pontua as principais contribuições do PIPE para pequenas empresas que buscam levar inovações tecnológicas ao mercado e quais perspectivas podem ser esperadas para o futuro do Programa. Confira!

Quais os impactos gerados pelo Programa PIPE nesses 20 anos?

Sérgio Salles-Filho – O principal impacto de um programa como esse é desenvolver um novo conhecimento, por meio da pesquisa, que se transformará em bens e serviços que a sociedade poderá usufruir. Na avaliação que fizemos há algum tempo e que estamos realizando uma segunda rodada, isso foi medido. O impacto foi muito positivo. Várias das empresas analisadas – em torno de 250, na época – chegaram a ter produtos e serviços no mercado, chegaram a exportar e chegaram a colocar a tecnologia a serviço da sociedade, gerando empregos e faturamento, trazendo desenvolvimento local e aproximando a pesquisa da universidade da sociedade. É um investimento que vale a pena. O impacto é positivo do ponto de vista econômico e do ponto de vista social. Nós entendemos e mensuramos que é um dinheiro bem gasto, pois o retorno para a sociedade é positivo.

Qual a principal área beneficiada pelo programa?

SSF – Há uma grande diversidade de setores e áreas do conhecimento no PIPE, como biotecnologia, optoeletrônica e aeronáutica. O setor de TIC é dos mais importantes porque nessa área é possível desenvolver projetos mais próximos do mercado. Tecnologias de outras áreas, em geral, levam um tempo maior para chegar ao mercado

Em comparação com programas semelhantes existentes no exterior, como podemos avaliar a atuação do programa?

SSF – O programa norte-americano SBIR (Small Business Innovation Research), no qual o PIPE se inspirou, tem números bem semelhantes. O SBIR é um programa muito maior. São mais de 3 bilhões de dólares de investimentos e o PIPE tem se mostrado talvez tão eficiente quanto o americano, sob vários indicadores. Os indicadores que aparecem diferentes são justamente naqueles temas em que o Brasil ainda precisa evoluir, como capital de risco e licenciamentos de tecnologia, por exemplo. A oferta de capital de risco é muito maior e mais dinâmica lá do que  aqui. Além de ter mais investimentos em programas como o PIPE, nós precisamos ter uma estrutura de acolhimento daquilo que, na literatura, é chamado de vale da morte e garantir que, depois que se desenvolveu a tecnologia, ela realmente vire um produto ou serviço ou um processo. O PIPE, no Brasil, acaba também ajudando a criar esse ambiente, porque são desenvolvidas tecnologias por meio desses projetos que são interessantes do ponto de vista de mercado, atraindo investidores interessados no negócio. Entretanto, outros instrumentos são necessários para complementar o que o PIPE faz. A fase 3, juntamente com a Finep, é uma tentativa nesse sentido.

De acordo com os estudos realizados anteriormente, 60% dos projetos avaliados geraram alguma inovação. Por que esse dado é positivo? E qual o conceito de inovação nesses casos?

SSF – É um dado positivo porque se você for comparar com outros programas voltados para investimentos em empresas de base tecnológica, as taxas são bem menores. Os 60%, na verdade, são um número alto e são sinal de que a seleção inicial de propostas foi bem-feita. Agora é preciso entender que uma parte pequena dessa porcentagem é quem realmente consegue um resultado extraordinário e que acaba impulsionando os indicadores de todo programa. Esse mesmo fenômeno acontece em outros programas. Em torno de 10% das empresas são aquelas que realmente decolam com o auxílio do PIPE.

Considera-se como uma inovação produtos, serviços ou processos que chegam ao mercado ou que são utilizados pela sociedade. No caso das empresas do PIPE, o objetivo final é colocar produtos ou processos no mercado. Entretanto, o PIPE não tem como foco a comercialização de produtos, mas sim a pesquisa que antecede o desenvolvimento de novas tecnologias.

Podemos afirmar que, de certo modo, o PIPE auxilia na transformação de pesquisadores em empreendedores?

SSF – Acredito que sim, auxilia, embora não tenha requerimentos nesse sentido, inclusive porque em alguns casos o pesquisador não é o empreendedor que está na empresa. É preciso apoiar pesquisadores que já tenham alguma ideia viável ou inovadora e que tenham uma propensão, tendência ou interesse em empreender. O PIPE cumpre essa função. Ele tira o pesquisador do ambiente exclusivo de pesquisa e faz com que ele faça pesquisa em um ambiente que olha para o mercado, para a sociedade, estimulando o empreendedorismo e indo além de outros tipos de auxílios da Fapesp. No caso do PIPE, é a pesquisa na empresa que interessa, estimulando o crescimento de pequenas empresas por meio da inovação.

Portanto, o PIPE influencia na criação de um ecossistema de inovação e empreendedorismo regional mais robusto?

SSF – Sem dúvida, uma vez que o programa é o principal instrumento de financiamento para desenvolvimento tecnológico em pequenas empresas. Inclusive, ele é complementar ao PAPPE da Finep. As fases 1 e 2 do PIPE, que atua mais na parte da pesquisa, do modelo de negócio, etc. A Fase 3 já tem mais essa visão de mercado, que é feito junto com a Finep, no programa PAPPE. Embora a gente não tenha medido exatamente isso, fica claro que os projetos que foram mais bem-sucedidos são aqueles em que houve a cooperação com centros de pesquisa.

A crise financeira pode afetar, de alguma maneira, o PIPE? Podemos esperar algum prejuízo?

SSF – Eu acredito que não de forma importante, até porque as diminuições de arrecadação, que se refletem no orçamento da Fapesp têm sido gerenciadas pela Fundação. A Fapesp é financiada por 1% do ICMS. O que acontece é que, quando cai a atividade econômica, cai o ICMS e esse 1% que era X passa a ser X menos alguma coisa. A Fapesp é uma instituição muito bem administrada e ela tem reservas. Com a crise financeira, ela foi afetada, claro, porque o orçamento dela diminui em função da movimentação da atividade econômica. Mas, das que eu conheço no Brasil, é uma das que menos foi afetada. Existe um efeito em cadeia, com a diminuição de investimentos em empresas, que eu acredito que seja muito mais grave do que uma possível constrição dos recursos para o PIPE.

A crise ocasiona um problema transversal porque os agentes econômicos retraem seus investimentos e isso causa um efeito ruim na economia. Eu acredito que o PIPE não será afetado. Eu acho até que ele é uma forma de apoiar investimentos inovadores no momento em que outras fontes estão reduzindo ao mínimo. Quem realmente quer empreender e tem boas ideias, com um bom projeto, será financiado. O PIPE tem justamente a função de estimular novos investimentos inovadores, o que em momentos de crise são os que mais têm chance de ajudar a se sair da crise.

 

 

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