14 de fevereiro de 2017 “Quando observamos indicadores de competitividade das empresas, não há mais espaço para falta de pragmatismo no campo da inovação, precisamos de estratégias focadas em oportunidades reais”
Leia a íntegra da entrevista concedida por Patrícia Leal Gestic, diretora de Propriedade Intelectual da Agência de Inovação Inova Unicamp, para a Revista Pesquisa FAPESP. As perguntas foram formuladas pelo jornalista Rodrigo de Oliveira Andrade. A reportagem você pode acessar nesse link.
- Poderiam explicar a que devemos atribuir essa boa colocação da Unicamp no ranking dos depositantes nacionais de patentes em 2016?
Historicamente, a Unicamp tem excelente posicionamento em rankings de patentes, em especial, em 2016, quando atingimos o novo recorde de 80 pedidos de patente junto ao INPI, sem considerar os depósitos no exterior. Empenhamos nossos maiores esforços para ampliar a cultura de inovação na Unicamp para que tenhamos cada vez mais oportunidades de novas comunicações de invenção e programas de computador, que chegam até a Agência de Inovação Inova Unicamp visando proteção, ações de marketing, estudo de mercado e prospecção de empresas ou criação de startups para viabilizar licenças de patentes, licenças de software registrados, transferência de know-how, novas cultivares, e etc. Uma das principais estratégias que colabora com este resultado é estar próxima às unidades para informar, incentivar e promover interação com os alunos de pós-graduação e docentes, para que eles possam entender um pouco mais sobre como a Agência de Inovação Inova Unicamp pode contribuir com ferramentas de informação e conceitos de inovação de valor, ineditismo e outros conceitos para agregar valor e robustez às propostas de projeto de pesquisa e seu desenvolvimento em si, mesmo nas fases mais iniciais.
Neste sentido, temos grande foco estratégico em aulas inaugurais da pós-graduação, disciplinas regulares de pós-graduação que possuem aderência aos temas de nossas palestras, além de ofertas de capacitação direcionadas em levantamento da bibliografia em bases de patentes. Nosso grande objetivo é despertar o interesse dos jovens pesquisadores – alunos de mestrado e doutorado – para que desenvolvam algo que tenha relevância, atenda demandas tecnológicas reais (aplicação industrial) e com uma solução pioneira (nova e inventiva). Diante de nossa estratégia de abordagem interna, temos cada vez mais novas possibilidades de geração de patentes: – estimulamos o aluno ingressante de pós-graduação a desenvolver algo relevante em sua área de estudo e que atenda uma demanda tecnológica, – transmitimos conceitos de inovação de valor e – oferecemos ferramentas de informação de patentes. A consequência é a geração de trabalhos promissores e passíveis de serem patenteados. Os resultados aparecem naturalmente. Em 2016, registramos recorde em comunicações de invenção e recorde em patentes depositadas junto ao INPI. Esse indicador é muito importante para nós pois mostra que, embora tenhamos ainda muito trabalho a ser feito, estamos chegando cada vez mais próximos dos pesquisadores, aumentando assim a possibilidade de desenvolver algo que traga benefício científico, tecnológico e social ao ser transferido para o mercado.
- Como avaliam a evolução da Unicamp em termos de desenvolvimento tecnológico e produção intelectual nos últimos anos?
Do ponto de vista tecnológico e de avaliação de oportunidades de patentes e know-how, a Unicamp vem crescendo. Nos últimos 4 anos, implantamos diversas melhorias e aprimoramos estratégias de marketing, de prospecção global de empresas, de monitoramento de editais de grandes investimentos, de abordagem de empresa, de oferta de propriedade intelectual da Unicamp; seja patente, software, know-how, material-biológico, produtos de mídia e outros. Um exemplo que podemos ilustrar é da nova estratégia de marketing e identidade visual para cada nova patente da Unicamp, além de vídeos de novos software como material para divulgação, o que teve impacto muito positivo no Brasil e exterior. Além do material de marketing ser utilizado por nossos agentes para abordar as empresas-alvo prospectadas, os perfis tecnológicos ficam disponíveis em redes sociais e webpage. Além da abordagem da Inova Unicamp aos grupos de pesquisa da Unicamp, observamos que nossas estratégias e resultados estão promovendo o interesse pela Agência de Inovação da Inova Unicamp pois um número crescente de pesquisadores tem nos procurando para apoiá-los e compartilhar interesse por oportunidades com o setor industrial impactando no aumento na produtividade em 2016, resultando em recorde de comunicações de invenção, recorde em depósito de patentes, recorde de licenças de propriedade intelectual, submissão de projeto FUNTEC-BNDES, Embrapii, etc. Além dos indicadores, um resultado quantitativo da performance da Unicamp, podemos qualitativamente dizer que buscamos cada vez mais tornar a tecnologia e sua estratégia de proteção mais robusta e vantajosa não apenas em atendimento aos requisitos legais mais também propondo aos pesquisadores, em alguns casos, a obtenção de outros dados experimentais para que uma dada patente tenha um diferencial ainda maior para o mercado. Na atual situação do Brasil, em especial quando observamos os indicadores de competitividade e inovação das empresas, não há mais espaço para falta de pragmatismo no campo da inovação, precisamos inexoravelmente de estratégias que se desdobrem em ações e mecanismos táticos efetivos focados em oportunidades reais. As universidades, como fonte de conhecimento e de propriedade intelectual, têm cada vez mais responsabilidade social frente ao investimento que recebe, cabendo a ela, viabilizar oportunidades com o setor privado que promovam o avanço no estágio de desenvolvimento de dada tecnologia objetivando inovação, seja por meio de transferência de patente, projetos colaborativos de desenvolvimento com empresas em especial aqueles de TRL 3 a 6 e TRL 6 a 9. Tanto a universidade quanto a empresa deve ser visto como relevante e como verdadeiro parceiro para a mudança do cenário brasileiro. A Agência de Inovação Inova Unicamp tem em seu quadro de diretores, profissionais com experiência, visão de negócio e de mercado, permitindo que a Unicamp esteja mais próxima do setor industrial e de suas demandas.
- Que orientações poderíamos dar aos pesquisadores para que eles avaliem melhor se os resultados de suas pesquisas são patenteáveis?
A orientação é simples: se o resultado alcançado por seu projeto tem chance de ser inédito e apresenta algum tipo de vantagem, recomendamos a comunicação de invenção ou registro do programa de computador para apreciação por nossa Agência Inova Unicamp. Como diretora de Propriedade Intelectual, tenho como objetivo minimizar a burocracia e reduzir o trabalho do pesquisador durante o processo de patenteamento, de respostas ao exame, e etc. Partimos do princípio que o pesquisador é aquele que desenvolve e investe seu tempo em buscar alternativas para dado desafio tecnológico e comprová-las cientificamente, potencializando desta forma a chance de novas invenções. Nossa proposta é fornecer informações objetivas e precisas (tais como no Guia do Inventor, 2016), ferramenta de busca de patentes e orientação para uso destas bases em todos os momentos do desenvolvimento de seu projeto. Ter informação do que já existe no mundo é o grande “pulo do gato” e não basta o levantamento das bases de artigos científicos, aliás está longe de ser suficiente, segundo a WIPO (World Intellectual Property Organization).
Com esta orientação básica, trazemos para a Inova Unicamp a responsabilidade pela avaliação da patenteabilidade e ao mesmo tempo promovemos uma experiência pedagógica aos pesquisadores pois eles acompanham todas as etapas de análise. Para aqueles que se interessam pelo tema, a Inova Unicamp sempre se propõe a compartilhar o conhecimento aprofundado e estimular a disseminação deste conhecimento dentro do grupo de pesquisa. Mas não podemos esperar que esta seja a regra, ou seja, a meu ver, não devemos esperar ou transferir a responsabilidade da avaliação ao pesquisador pois nossos procedimentos operacionais já são bastante otimizados, ágeis e temos profissionais qualificados para este fim. Quando falamos em vantagens, significa saber com clareza o diferencial quando comparado ao resultado obtido com a melhor alternativa similar que já existe no mercado ou na literatura.
- Como deve proceder o pesquisador que ao final de um projeto acredita que os resultados obtidos são passíveis de proteção intelectual? Qual o melhor caminho?
O pesquisador que ao final de um projeto acredita que seu resultados podem ser passíveis de proteção por propriedade intelectual deve primeiramente evitar a divulgação prévia de seus resultados mantendo-os confidenciais (artigos, trabalhos em eventos, teses e dissertações) e revelar seus resultados exclusivamente para a Agência de Inovação Inova Unicamp, para que se defina a melhor estratégia de proteção e estratégia de abordagem de mercado. É importante salientar que a Inova Unicamp é responsável não apenas por proteção por via de patente de invenção, patente de modelo de utilidade e desenho industrial; mas também software, cultivar e marca. O melhor caminho é acessar o site e fazer seu contato online. Para patentes, temos um formulário de comunicação de invenção online simples, objetivo e que permite o anexo de relatórios e documentos em geral. Para software também disponibilizamos formulário online para registro. Tanto cultivar quanto marca, o contato deve ocorrer por e-mail específico conforme informado em nosso site. A partir deste contato, inicia-se formalmente o processo interno de análise e tramitação. Temos um canal eficiente para esclarecimento de dúvidas e informações gerais.
- Como a Inova Unicamp orienta seus pesquisadores nesse sentido?
Na Unicamp, a Agência de Inovação é a única responsável por toda e qualquer instrução e análise de propriedade intelectual, proteção dos ativos intangíveis, negociação e comercialização da propriedade intelectual (patente, software, cultivar, know-how, etc). Assim, caso um inventor vinculado à Unicamp (aluno, pesquisador, professor, funcionário) tenha resultados inéditos de sua pesquisa, orientamos envio da Comunicação de Invenção à nossa Agência, para análise especializada. Para isso, devem preencher e enviar um formulário online de invenção através de nosso site, também anexando documentos relevantes. Em nosso site, temos listados todos os serviços que disponibilizamos internamente, desde de comunicado de invenção de patente, registro de programa de computador, depósito de cultivar ou marca.
Após a comunicação, iniciam-se os procedimentos internos de checagem de documentação, verificação de parcerias existentes, mapeamento de possíveis convênio envolvidos, levantamento de informações sobre fomento, quem são os pesquisadores envolvidos e qual o vínculo formal, entre outros. Em seguida, inicia-se a análise técnica e entrevista presencial obrigatória, com foco técnico e também estratégico. Neste momento, são feitas as orientações julgadas necessárias.
- Vocês ajudam os pesquisas no custeio do processo de obtenção de registros de patentes?
A Unicamp assume a despesa de todo o processo de proteção quando a Universidade é titular exclusiva, seja com as etapas de busca, análise e redação, assim como as taxas oficiais. A Política de Propriedade Intelectual da Universidade, prevê situações de cotitularidade. Para este caso, verifica-se a participação das partes e negocia-se os custos. Quanto o cotitular é uma empresa, negociamos para que a empresa reembolse estas despesas na íntegra, na maior parte dos casos. Em situações de exploração não-exclusiva, analisamos e negociamos caso a caso. Já quando é feito o processo de internacionalização desta tecnologia, cujos custos são mais representativos a empresa assume as despesas internacionais.
- Tentar obter um registro de patente no exterior costuma ser melhor e mais rápido do que no Brasil?
No Brasil, encontramos o desafio da morosidade para concessão de uma patente pelo INPI em função do backlog, ou seja, o INPI não consegue suprir a demanda, uma vez que são poucos examinadores para um volume muito grande de análises de patentes. As projeções mostram que não temos condição no Brasil de fazer uma análise rápida: hoje, o processo entre o depósito e a concessão da carta patente gira em torno de 8 a 14 anos. Isto não inviabiliza a oportunidade de transferência de tecnologia a partir de um pedido de patente associado ao know-how. Quando avaliamos do ponto de vista dos EUA, eles têm uma agilidade e facilidade muito maior: enquanto aqui no Brasil temos de 150 a 200 examinadores no INPI, estive recentemente no USPTO (United States Patent and Trademark Office) em uma missão da FAPESP e tomei conhecimento de que existem cerca de 9 mil examinadores. Como resultado, o tempo médio de concessão é incomparavelmente menor que no Brasil: de 2 a 4 anos. No Japão, este tempo chega a ser menor. Embora a proteção da propriedade industrial no Brasil esteja em uma situação crítica, não se deve ignorar a importância estratégica da proteção dos ativos como diferencial competitivo e ganho mercadológico e, portanto, deve ser mantida. Nos dias de hoje, é fundamental que as empresas, em especial as de base tecnológica, que buscam competitividade nacional e internacional, se atentem ao seu portfólio de ativos intangíveis.
- Que outras orientações poderíamos dar aos pesquisadores para que avaliem se seus produtos podem ser protegidos intelectualmente?
Muito mais do que pensar na proteção e na viabilidade dos próprios pesquisadores avaliarem se os resultados de suas pesquisas podem ser protegidas, acrescentaria o desafio do pesquisador buscar ativamente iniciativas para avançar no estágio de desenvolvimento de suas tecnologias (TRL). Ou seja, buscamos cada vez mais orientá-los para que possam evoluir em uma dada tecnologia de acordo com sua capacidade interna (de seu laboratório) ou por meio de parcerias (instituições de pesquisa ou empresas), o quanto for capaz, a fim de minimizar os riscos tecnológicos e favorecer oportunidades reais de transferência da tecnologia para o mercado. Não é incomum observarmos grupos de pesquisa no Brasil que produzem muito do mesmo, com pequenas alterações. Esta estratégia é equivocada. São poucos os grupos de pesquisa que buscam parceria para que tenham investimento (ou fomento) para evoluir dada tecnologia para patamares antes não alcançados (TRL 3 a 6 e TRL 6 a 9).
Finalizo esta entrevista à Revista Fapesp dizendo que não cabe apenas ao NITs mas também aos órgãos de fomento à pesquisa incentivarem formalmente, em todos os seus programas que envolvem ciência aplicada, o levantamento de informação de bases de patentes tanto para propor novos projetos quanto para avaliá-lo ao longo do desenvolvimento. Para apoiá-los, existe o NIT. Na Unicamp, a Agência de Inovação Inova Unicamp estará sempre de portas abertas para servir como um facilitador e promotor da conectividade entre as áreas, parceiros e pessoas.