23 de março de 2016 Sistema identifica enzima e potencializa produção de etanol
Texto: Carolina Octaviano
Foto: Thomaz Marostegan
O XIMMER, programa de computador desenvolvido por pesquisadores do Instituto de Biologia (IB) da Unicamp, é voltado para identificação de enzimas da família xilose isomerase e promete resultar em ganhos na produção do chamado etanol de segunda geração, no qual o biocombustível é gerado a partir dos coprodutos da cana-de-açúcar – palha e bagaço – usados no processo tradicional de fabricação de etanol e açúcar. A tecnologia foi recentemente licenciada para a empresa Biolecere, subsidiária da GranBio e que tem como enfoque principal a realização de pesquisa, desenvolvimento e inovação (PD&I).
De acordo com o pesquisador Marcelo Falsarella Carazzolle, responsável pelas pesquisas que resultaram na criação do software, a importância da tecnologia está justamente no aproveitamento da xilose – estrutura da planta -, o que pode ocasionar um aumento de 40% na produção de etanol no Brasil, país que já é um dos líderes mundiais neste quesito. Conforme dados divulgados pelo Ministério da Agricultura e pelo Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, o Brasil produziu, apenas na safra de 2013/2014, 28.017.450 milhões de metros cúbicos de etanol. Ainda de acordo com o órgão, nesta mesma safra, o país exportou 2.917 milhões de metros cúbicos de etanol, valor que corresponde a um ganho de 1.869 bilhão de dólares.
É relevante mencionar que a enzima xilose isomerase, quando inserida no genoma – onde consta toda informação hereditária de um organismo – da levedura, tradicionalmente utilizada na fabricação de etanol, atua como um catalisador da xilose permitindo que esta seja utilizada como fonte de carbono pelo organismo para produção de etanol. Em outras palavras, o programa de computador XIMMER ocasiona um melhor aproveitamento da palha e do bagaço da cana, proporcionando também um aumento na eficiência do processo.
“Extraem-se açúcares da biomassa vegetal, utilizando as tecnologias de pré-tratamento e a hidrólise enzimática, que consegue liberar várias formas de açúcares e em grandes quantidades, como a glicose e xilose. A levedura consegue consumir a glicose naturalmente e converter em etanol, mas a xilose não pode ser consumida pela levedura e acaba sendo não aproveitada no processo. Dessa forma, conseguir aproveitar essa xilose que está no meio, convertendo-a em etanol, faria o processo muito mais eficiente”, explica Carazzolle.
Embora a enzima xilose isomerase esteja disponível na natureza – sendo encontrada em praticamente todas as bactérias -, é raro identificar aquelas que, quando inseridas no genoma da levedura, permitam que se consuma a xilose e produza etanol eficientemente. O pesquisador comenta ainda que, além do aproveitamento da xilose no processo de produção de biocombustível, o software também tem papel importante na identificação de enzimas não protegidas por patente. “O XIMMER permite que se faça uma análise estatística de bioinformática nos bancos de dados públicos de proteínas, identificando xilose isomerases que, ao serem inseridas no genoma da levedura, tenham uma maior probabilidade de serem funcionais. O software também tenta identificar xilose isomerases que escapem das que já estão patenteadas”, conta.
Na opinião de Carazzolle, a tecnologia – que foi desenvolvida com o apoio do então aluno de mestrado Felipe Alonso Martins – deve ocasionar ganhos para as empresas licenciadas. “A identificação de uma nova xilose isomerase funcional e que não esteja protegida por patente é fundamental para essas empresas (GranBio e Biocelere), pois permite a construção e a liberdade de operação de leveduras geneticamente modificadas que tenham a capacidade de consumir xilose. Essa levedura, quando utilizada na indústria de etanol de segunda geração, permite que toda a xilose, anteriormente desperdiçada, passe a ser convertida em etanol”, frisa o pesquisador.
Patricia Magalhães de Toledo, gerente de inovação da GranBio, confirma que a tecnologia já está sendo utilizada pela empresa em projetos que vem sendo desenvolvidos pela Biocelere. “Essa tecnologia atende uma das necessidades que possuímos nos projetos internos de PD&I de leveduras adequadas para a produção de etanol de segunda geração. A xilose isomerase é uma enzima que possibilita que a levedura consuma a xilose, açúcar que não é naturalmente consumido por ela e que é presente no processo produtivo de etanol celulósico. Se a xilose não for consumida, há redução na competitividade do etanol de segunda geração”, completa. Ela conta que a empresa teve conhecimento da tecnologia a partir do acompanhamento de publicações científicas de Carazzolle. Além disso, o fato de a GranBio já ter feito uma parceria anterior com o laboratório em que ele atua foram fatores que propiciaram o licenciamento.
Contudo, a gerente da GranBio destaca ainda a importância da Agência de Inovação Inova Unicamp no licenciamento do programa de computador. “A Inova Unicamp teve um papel muito importante em concretizar a negociação e em viabilizar a licença da tecnologia”, aponta Patricia. Opinião esta que é compartilhada com o pesquisador. “A Inova foi fundamental nesse processo, nos auxiliando, tanto na etapa de registro do software, quanto no contato e negociação com a empresa”, conclui.
Sobre a Biocelere
A BioCelere é a subsidiária da GranBio para realizar as atividades de pesquisa, desenvolvimento e inovação (PD&I). Tendo como cientista-chefe o Professor Doutor Gonçalo Amarante Pereira, que possui grande destaque na pesquisa em biotecnologia no país, a BioCelere entrou em operação efetivamente no início de 2013, no condomínio empresarial Techno Park em Campinas – SP. As atividades de PD&I da BioCelere se concentram em quatro principais áreas: melhoramento genético de cana-energia para obtenção de variedades com alto conteúdo de biomassa; estudo do processamento de cana-energia para disponibilização dos açúcares da biomassa; desenvolvimento de leveduras para produção de etanol a partir de açúcares da biomassa; e desenvolvimento de bactérias para produção de butanol a partir de açúcares da biomassa. Sua atuação envolve: desenvolvimento de novas tecnologias a partir de rotas biológicas, aprimoramento de tecnologias de empresas parceiras; e prospecção e avaliação tecnologias comercias para uso industrial.