2 de fevereiro de 2015 INNOVA Energias Renováveis investe R$ 4 milhões no Parque Científico e Tecnológico da Unicamp
Texto: Juliana Ewers Fotografia: Divulgação
Atenta aos desafios relacionados à gestão de resíduos sólidos nos municípios brasileiros, a INNOVA Energias Renováveis, que licenciou a tecnologia italiana de Pirólise a Tambor Rotativo, instala sua primeira unidade de pesquisa no Brasil. Com um investimento da ordem de R$ 4 milhões – em três anos, considerando a aplicação em equipamentos, infraestrutura e pesquisa –, o laboratório da empresa será implantado no Parque Científico e Tecnológico da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas), por meio de convênio de P&D. Essa é a primeira empresa com proposta aprovada por meio do edital de seleção para instalação do Parque.
Para o diretor-executivo da Agência de Inovação Inova Unicamp, Milton Mori, a chegada da empresa demonstra a vocação do parque para uma outra área. “Temos muitas empresas do ramo de TI (Tecnologia da Informação). Essa é a primeira empresa na área de química e energia. O interessante é que desenvolver esse tipo de tecnologia impacta não somente na geração de conhecimento, como também no direcionamento de políticas públicas”, analisa.
Para o reitor da universidade, José Tadeu Jorge, a presença da INNOVA Energias Renováveis no Parque Científico e Tecnológico da Unicamp fortalece o compromisso da universidade com ações que permitem que o conhecimento gerado pelas pesquisas propicie melhores condições de vida para as pessoas. “Esforços e pesquisas em conjunto permitirão contribuir para a melhoria do meio ambiente e da qualidade de vida”, reforça.
“Nesse contexto, o Parque Científico e Tecnológico da Unicamp demonstra a importância de seu papel como agente catalisador da união do conhecimento produzido pela universidade com empresas interessadas em desenvolvimento tecnológico conjunto”, completa o diretor do Parque Científico e Tecnológico da Unicamp, Eduardo Gurgel do Amaral.
A escolha pela região, segundo o engenheiro Fernando Reichert, diretor da empresa, partiu do interesse da INNOVA Energias Renováveis em estar próximo ao corpo docente renomado da universidade, além do fato de o estado de São Paulo ser considerado o berço da inovação e de grande interesse comercial. “Essa é uma região que tem demandas claras nesse setor”, afirma.
As dificuldades de gestão de resíduos sólidos e os impactos causados como: contaminação das águas, qualidade e quantidade de recursos hídricos disponíveis atualmente, e a piora da qualidade do ar são demonstrativos da necessidade de se pensar em novas alternativas.
O caso da cidade de Campinas é um exemplo. Com a vida útil encerrada do aterro sanitário Delta A, o município teve de começar a exportar seu lixo para um aterro particular de uma cidade vizinha – Paulínia –, tendo em vista que a Cetesb (Companhia de Tecnologia de Saneamento Ambiental) não liberou o uso do Delta B. A negativa se deu pela proximidade com o Aeroporto Internacional de Viracopos. Desta maneira, Campinas despende hoje R$ 91 milhões com o contrato de duração de um ano com um consórcio, para efetuar limpeza urbana, coleta de lixo – domiciliar, orgânico, hospitalar e seletiva – e gestão do Delta A. E mais R$ 38 milhões com o contrato com o aterro, para transporte e gestão do lixo enviado a Paulínia. Esse segundo acordo também tem validade de um ano. Campinas, que tem mais de 1,1 milhão de habitantes, produz diariamente 1,3 mil toneladas de lixo.
Alinhada com a Política Nacional de Resíduos Sólidos, a tecnologia da INNOVA Energias Renováveis pode ser vista como uma das opções disponíveis para enfrentar o problema de maneira mais sustentável, pois consiste em um reator de pirólise – processo em que a matéria orgânica é decomposta após ser submetida a condições de altas temperaturas (cerca de 450º C) em ambiente desprovido de oxigênio –, que é composto por um tambor rotativo aquecido externamente. No interior do tambor, são inseridos os resíduos. Sob condição de operação controlada, a matéria se transforma em gás de síntese. Na saída do reator de pirólise, o gás de síntese – ainda com contaminantes – segue para um sistema de limpeza e purificação. Nesta etapa, são removidos particulados e gases ácidos, tornando o gás limpo, composto por hidrogênio, monóxido de carbono e hidrocarbonetos leves, com aproximadamente 50% do poder calorífico do gás natural. Parte do gás de síntese – cerca de 30% – é utilizada para alimentar o processo e o restante – 70% – pode ser utilizado para substituir outros combustíveis na produção de calor ou energia elétrica.
Sob o ponto de vista prático, a tecnologia da INNOVA Energias Renováveis converte materiais orgânicos – que possuem carbono e hidrogênio em sua composição – em gás e mantém os inorgânicos – vidro, metal, areia, pedra e sais – com suas propriedades físicas inalteradas, devido à baixa temperatura de operação.
“É preciso ressaltar a diferença entre a incineração e o aquecimento em ambiente sem oxigênio, que é o caso da pirólise. A queima direta dos resíduos em câmara de combustão produz poluentes, inclusive cancerígenos como dioxinas e furanos. Produz cinzas volantes, que são perigosas e têm alto custo de disposição. E os gases de combustão são altamente agressivos. No caso da pirólise, o processo transforma o lixo em um gás combustível limpo, similar ao gás natural, que pode substituir outros combustíveis sem qualquer risco ambiental ou à saúde pública. A tecnologia pode produzir também biochar a partir de biomassa, que pode ser usado inclusive na agricultura para o combate à desertificação e à perda de carga orgânica”, explica Reichert.
Uma usina da INNOVA Energias Renováveis tem vida útil estimada em 45 anos. Retomando o exemplo, para uma cidade do tamanho de Campinas, seria necessária a instalação de ao menos sete usinas com capacidade para processar 150 toneladas/dia, para dar conta da demanda.
No Parque Científico e Tecnológico da Unicamp, a usina será em escala laboratorial, apenas para fins de pesquisa e desenvolvimento da tecnologia. Sob a execução do professor Edson Tomaz, da Faculdade de Engenharia Química, o projeto pretende validar os resultados ambientalmente favoráveis da tecnologia e promover uma ampliação da aplicação da mesma. Uma das linhas de estudo é, por exemplo, a produção de carvão ativado para utilização em filtros.
Atualmente, a tecnologia da INNOVA Energias Renováveis se aplica a resíduos urbano, industrial, hospitalar, medicamentos vencidos, entre outros. No entanto, para fins de pesquisa no Parque Científico e Tecnológico da Unicamp, o resíduo será proveniente de convênios e em baixa amostragem – não ultrapassando uma tonelada. O transporte se dará por meio de containers lacrados para impedir contaminação.
Para o desenvolvimento deste projeto e de novas unidades, a INNOVA Energias Renováveis contará com a parceria da empresa ELECTRA Energy, proprietária de unidades de geração de energia, e do grupo GSN, que possui experiência na estruturação de empreendimentos.
Pirólise a tambor rotativo: entenda melhor a tecnologia da INNOVA
Texto: Juliana Ewers Fotografia: Antônio Scarpinetti – Ascom – Unicamp
Confira a entrevista com o professor Edson Tomaz, da Faculdade de Engenharia Química da Unicamp.
Como o senhor analisa o desenvolvimento dessa tecnologia no Brasil? E quais os benefícios da mesma?
As alternativas de tratamento ou disposição final de resíduos orgânicos mais empregadas no Brasil são, em geral, aterros para resíduos domiciliares e industriais não perigosos, incineração para resíduos orgânicos perigosos e coincineração em fornos de cimento para resíduos orgânicos com alto poder calorífico. Estas tecnologias apresentam vantagens e desvantagens. Os aterros ocupam grandes espaços, problemas de emissões fugitivas e baixa taxa de recuperação energética. A incineração apresenta problemas de emissões de particulados contendo metais, óxidos de nitrogênio e dioxinas e furanos. Além disso, apresenta uma grande vulnerabilidade quanto às emissões, pois depende fortemente dos tipos e quantidades de resíduos processados, cujo controle pode não ser muito rigoroso. A incineração não permite o aproveitamento energético para prevenir a formação das dioxinas. O tratamento em fornos de cimento é a única com aproveitamento energético máximo dos resíduos mas é restrita a resíduos com alto poder calorífico. A pirólise, por sua vez, apresenta um grande potencial no tratamento de resíduos. Trata-se de um processo térmico, mas de impacto ambiental bem menor do que a incineração, pois as formações de dioxinas, furanos e óxidos de nitrogênio não são favorecidas. Além disso, como o processo se dá a temperaturas menores do que na incineração, a formação de material particulado contendo metais é desfavorecida.
A energia que resulta da pirólise pode ser aplicada em que tipo de atividade?
Associada a essas vantagens citadas, há a possibilidade de recuperação energética dos resíduos com a queima subsequente dos gases gerados na pirólise. A energia poderá ser utilizada na sua forma térmica, por meio de geração de vapor, ou elétrica, por meio de um gerador estacionário. Deve-se complementar ainda, que o resíduo sólido remanescente para alguns resíduos processados apresenta potencial de uso agrícola como fonte de nutrientes, que pode ser uma pesquisa adicional. Alguns resíduos poderão ser ainda transformados em produtos de uso industrial, tais como: o carvão ativado, adsorvente de alta área superficial empregado na descontaminação de água e gases, que é outra linha de pesquisa que pode ser desenvolvida.
Como foi pensando esse convênio de P&D e quais as áreas que serão exploradas nesse primeiro momento?
Nesta primeira etapa do projeto o objetivo é avaliar as emissões e os resíduos gerados para o tratamento de vários tipos de resíduos, com intuito de avaliar e confirmar as vantagens desta tecnologia mencionadas anteriormente, ou mesmo, avaliar em quais condições estas emissões são as menores possíveis. Na sequência ou em paralelo, pesquisa sobre o valor agronômico dos sólidos gerados poderão ser desenvolvidas, bem como a obtenção de carvão ativado de resíduos orgânicos por meio de pirólise lenta de alguns resíduos.
Há ainda uma questão importante em relação ao manuseio de resíduos sólidos dentro da universidade. Por outro lado, sabemos que este se dará em escala laboratorial.
Gostaríamos que o senhor nos explicasse exatamente o que seria essa escala laboratorial. Há riscos de contaminação?
Trata-se de uma unidade de pequeno porte, como não poderia deixar de ser, numa escala que permita avaliar a eficiência e as vantagens deste processo e transpor estes resultados para uma escala industrial. As quantidades serão pequenas, especialmente quando comparadas com as quantidades de resíduos gerados e manuseados hoje na universidade. Além disso, todos os cuidados serão adotados para prevenir qualquer tipo de contaminação. Os riscos de contaminação desta atividade não são diferentes dos riscos de contaminação das demais atividade de pesquisa realizadas na Unicamp.
Quantidades pequenas de resíduos ou qualquer outro produto químico podem provocar contaminações. O fator mais importante, neste caso, são os cuidados que deverão ser adotados no manuseio destes resíduos, para prevenir a contaminação de solo e águas subterrâneas, não diferente de outras atividades de pesquisa. As emissões atmosféricas são baixas devido ao pequeno porte da unidade de pirólise e serão monitoradas.
Hoje, a Unicamp incinera os seus resíduos orgânicos gerados nos laboratórios e desativa e encaminha para aterro sanitário os seus resíduos da área da saúde. A pirólise pode ser uma alternativa de menor impacto ambiental e poderá ser uma alternativa para o futuro tratamento dos resíduos da Universidade. Os resultados das pesquisas responderão estas questões.