Tecnologia desenvolvida no Instituto de Biologia (IB) da Unicamp permite encapsular óleos essenciais para aplicações como biopesticida natural, sem a presença de compostos artificiais e sem malefícios para a saúde humana

Esta matéria compõe a série Prêmio Inventores 2024 | Texto: Caroline Roxo – Inova Unicamp | Foto: Arquivo pessoal da B.nano

Foi lendo um romance de Jorge Amado que Ligia Nunes, pesquisadora do Instituto de Biologia da Universidade Estadual de Campinas (IB Unicamp), teve a ideia que se transformou em uma nova tecnologia para o encapsulamento de óleos essenciais e manteigas. A ideia tomou forma de pesquisa e gerou resultados com alto potencial de inovação, protegidos com estratégia da Agência de Inovação Inova Unicamp.

Ligia Nunes, atual pesquisadora da Universidade Federal de Uberlândia (UFU) | Foto: Arquivo pessoal da Ligia Nunes

“Eu estava lendo um famoso romance do Jorge Amado, que cita o cravo e a canela. Nesse momento, eu tive a ideia de estudar sobre esses ingredientes naturais e formular as nanopartículas com esses materiais e deu certo, pois eles tinham estabilidade físico-química”, conta Nunes, que na época do desenvolvimento da tecnologia estava em seu estágio de pós-doutorado no IB Unicamp com  orientação da professora Eneida de Paula.

A tecnologia propõe uma forma de encapsular manteigas, ceras e óleos essenciais para torná-los mais estáveis e ativos, sem a presença de outros fármacos e compostos artificiais. A encapsulação usa nanopartículas, chamadas de carreadores lipídicos nanoestruturados (CLN), feitas de ingredientes naturais, que são seguros para o organismo humano e possuem propriedades inseticidas, bactericidas, antifúngicas e anestésicas. O depósito de patente foi licenciado para a startup B.nano que está trabalhando no desenvolvimento de um biopesticida para produtores de hortaliças e frutas.

Startup identifica potencial da tecnologia para atuar como biopesticida 

A startup B.nano, formada por três ex-alunos da Universidade Estadual Paulista (Unesp), identificou o potencial da tecnologia do CLN durante o programa Desafio Unicamp, uma competição de empreendedorismo organizada pela Inova que estimula a criação de empresas a partir de tecnologias protegidas da Universidade. Os participantes foram os campeões da categoria de Impacto Socioambiental, instituída em 2022. Eles desenvolveram um modelo de negócio baseado na tecnologia da Unicamp e após a final da competição seguiram com o licenciamento.

“A startup surgiu um pouco antes da competição, mas foi durante o Desafio Unicamp que a gente se organizou e se estruturou como empresa”, conta Jhones Luiz de Oliveira, um dos fundadores da B.nano.

No Desafio Unicamp, a B.nano modelou e validou um modelo de negócios que propunha aplicar a tecnologia no mercado agrícola para uso como biopesticida, uma aplicação que não estava inicialmente prevista na invenção. Os empreendedores identificaram uma oportunidade para inovar com um produto que usa matérias-primas naturais e pode se transformar em uma alternativa importante para a agricultura, devido ao uso intensivo de pesticidas nas plantações. 

O biopesticida natural está em fase de validação | Foto: Arquivo pessoal da B.nano

“Nós temos um mercado enorme e uma tecnologia que pode ser transformada em um produto natural, que não é tóxico para o ser humano e nem para o meio ambiente. Estamos buscando o desenvolvimento desse produto”, afirma Oliveira.

Atualmente, eles buscam captação de recursos financeiros para continuar as validações de um produto comercial que leva a tecnologia da Unicamp. “Selecionamos as culturas de tomate, de citros (como laranja e limão) e de uva para testar os efeitos do experimento nesses alimentos”, explicou o pesquisador e sócio-fundador da startup. Caso tenha sucesso, o produto da B.nano também atenderá ao mercado de orgânicos, que preza pela utilização de práticas de manejo produtivo sem insumos que possam pôr em risco o meio ambiente e o consumidor.

A startup está incubada na Incubadora Hubiz do Parque Tecnológico de Sorocaba e na Incubadora de Empresas Aquário de Ideias da Unesp de Registro. Em Sorocaba, possuem um contrato de Pesquisa e Desenvolvimento (P&D) e utilizam a estrutura do laboratório. Na Unesp de Registro, usufruem dos conteúdos e treinamentos oferecidos.

Como atuam os carreadores lipídicos

Os carreadores lipídicos são nanopartículas que encapsulam certas substâncias melhorando sua aplicabilidade. Eles reduzem a toxicidade, aumentam a solubilidade e potencializam a atuação. A pesquisadora e docente do IB, Eneida de Paula, conduz as pesquisas com carreadores lipídicos nanoestruturados (CLN), que são minúsculas esferas de gordura com uma superfície externa de surfactantes, um tipo de detergente.

Eneida de Paula, professora e pesquisadora do Instituto de Biologia (IB) da Unicamp | Foto: Pedro Amatuzzi – Inova Unicamp

“Eu trabalho há muito tempo com pesquisa em torno dos drug delivery, ou seja, sistemas carreadores que conduzem fármacos em seu interior. Esse sistema é como se fosse uma carriola, que transporta o produto em boa quantidade para o seu uso, apresentando benefícios, como deixar anestésicos mais potentes ou até mesmo reduzir a toxicidade de quimioterápicos”, explica Eneida de Paula, professora e pesquisadora do Instituto de Biologia (IB) da Unicamp e uma das inventoras. 

Lígia Nunes, atual pesquisadora da Universidade Federal de Uberlândia (UFU), tinha experiência em produtos naturais e notou que, como a estrutura dos carreadores era composta por lipídios sintéticos, seria possível substituí-los por gorduras naturais. Assim, ela comprou manteiga de cacau e trocou o lipídio artificial do carreador pelo natural tendo sucesso na eficiência da gordura. 

O carreador  desenvolvido é uma esfera minúscula, em que os ingredientes naturais atuam tanto na estrutura quanto como bioativos, dispensando o uso de fármacos ou outros componentes sintéticos, ou seja, químicos. A descoberta das pesquisadoras destaca-se não só pelas propriedades dos ingredientes naturais que substituem os sintéticos, mas também pela possibilidade de utilizar matérias-primas da flora brasileira, como os óleos essenciais de lavanda, capim-limão, eucalipto, tornando o produto de fácil acesso e com menor custo.

“Os óleos essenciais são bases fortes, fotossensíveis e voláteis. Então mesmo que sejam versáteis para várias aplicações, não tinha como fazer aplicação médica, principalmente para injetar. Com esse processamento em nanoformulação, transformando-os em carreadores, eles se tornam produtos seguros para serem aplicados. Antes era um óleo e agora é um material hidrossolúvel”, conta Nunes. 

Como licenciar uma tecnologia da Unicamp?

A Inova Unicamp disponibiliza uma vitrine tecnológica no Portfólio de Tecnologias da Unicamp. Empresas e instituições públicas ou privadas podem licenciar a propriedade intelectual desenvolvida na Universidade, como patentes, cultivares, marcas, programas de computador e know-how, com ou sem exclusividade. O contato e negociação são realizados diretamente com a Agência de Inovação da Unicamp pelo formulário de conexão com empresas. A Inova Unicamp também oferece ativamente as tecnologias às empresas, com o objetivo de levar o conhecimento gerado na Universidade ao mercado e à sociedade.

Conheça o Desafio Unicamp 

O Desafio Unicamp é o principal programa de promoção ao empreendedorismo da Universidade, organizado pela Inova Unicamp. Em 14 anos, o Desafio Unicamp já alcançou mais de 3.000 pessoas inscritas das cinco regiões do país. Desde 2020, a competição é realizada no formato virtual e qualquer pessoa com mais de 18 anos pode participar. A próxima edição será realizada no primeiro semestre de 2025. Acesse o site do Desafio Unicamp para acompanhar as novidades.

PRÊMIO INVENTORES 2024

INVENTORES PREMIADOS:

Eneida De Paula (IB Unicamp), Lígia Nunes de Morais Ribeiro (IB Unicamp), Simone Ramos de Castro (IB Unicamp), Ludmilla David de Moura (IB Unicamp), Viviane Aparecida Guilherme Damasio (IB Unicamp), Gustavo Henrique Rodrigues Da Silva (IB Unicamp), André Ricardo De Lima Damasio (IB Unicamp), Marcelo Ventura Rubio (IB Unicamp), Márcia Cristina Breitkreitz (IQ Unicamp), Marcelo Lancellotti (FCF Unicamp), Leonardo Fernandes Fraceto (UNESP), Mônica Pascoli (UNESP), Ricardo Antonio Polanczyk (UNESP), Daniel Junior de Andrade (UNESP), Felícia Pereira de Albuquerque (FUNDUNESP) foram premiados na categoria Propriedade Intelectual Licenciada no Prêmio Inventores 2024.

PROGRAMAÇÃO DE HOMENAGENS

Esta reportagem integra a série de reportagens especiais em celebração ao Prêmio Inventores 2024, que abordam algumas das tecnologias licenciadas, absorvidas pelo mercado e empresas spin-offs acadêmicas da Universidade Estadual de Campinas. Você pode acessar esses conteúdos pelo site da Inova  ou em formato de ebook na Revista Prêmio Inventores 2024 com lançamento previsto para este mês. A programação do Prêmio Inventores também incluiu o webinar sobre os 20 anos da Lei de Incentivo à Inovação e casos de sucesso de tecnologias da Unicamp absorvidas no mercado, que aconteceu no dia 10 de setembro. A gravação do webinar está disponível neste link.

Confira todos os premiados e homenageados no site Prêmio Inventores da Unicamp.

Os patrocinadores do Prêmio Inventores 2024 são: ClarkeModet e FM2S