19 de julho de 2022 Correio Popular | Empresa de Campinas desenvolve tecnologia e produz cosméticos sustentáveis
Sérum rejuvenescedor já é comercializado e seis produtos estão em processo final
Texto: Thiago Rovêdo | Foto: Ricardo Lima
A emissão de carbono na atmosfera e as consequências do efeito estufa para o planeta estão entre as principais preocupações das lideranças políticas e empresariais de todo o mundo. Consciente dessa problemática e interessada em dar sua contribuição ao meio ambiente, a doutora em Biologia Funcional e Molecular pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), Soraya El Khatib, fundou a empresa “S Cosméticos do Bem” e desenvolveu tecnologia para produzir cosméticos eficazes, seguros e em conformidade com todos os aspectos que envolvem o conceito de sustentabilidade. As pesquisas resultaram em um sérum rejuvenescedor, em comercialização, e mais seis produtos em fase final de desenvolvimento.
A “S Cosméticos do Bem” é empresa-filha da Unicamp e foi germinada em 2011 nas bancadas da instituição, mas a trajetória de Soraya começou aos 5 anos de idade, misturando os perfumes da mãe para obter fragrâncias diferentes. Aos 8, já produzia peças de teatro e pintava camisetas para vender aos amigos. Na adolescência, o sonho mudou. Soraya queria ser médica, mas não passou no vestibular de Medicina — que era sua primeira opção — e foi cursar Ciências Farmacêuticas. “A farmácia me trouxe mais possibilidades que a medicina, principalmente com o empreendedorismo. Sempre quis empreender, é algo que vem de meus antepassados, pois meu avô era um empreendedor. Depois de formada, fui ser professora e viajei muito antes de montar a empresa”, disse.
Composta por um sérum rejuvenescedor, já comercializado, e outros seis produtos em fase final de desenvolvimento, toda linha da “S Cosméticos do Bem” é sustentável de ponta a ponta. “Iniciamos as atividades em 2011, com o objetivo de criar produtos com diferenciais para o mercado brasileiro. A partir de 2015, nos tornamos uma empresa de base tecnológica. Começamos a fazer pesquisas e vimos oportunidades nesse mercado em inovação. Chegamos a ter 14 pesquisadores renomados. Mas depois que desenvolvemos a tecnologia, a equipe pode ficar mais enxuta. Hoje, temos empresas que nos procuram para que possamos crescer, apesar de todos os entraves políticos e econômicos, estamos conseguindo atravessar essa fase”, disse.
“Lançamos nosso produto no final de 2020, tomando o cuidado de usarmos embalagens recicláveis. Buscamos ser sustentáveis em todos os aspectos. Além disso, conseguimos aprovar projetos com o governo federal e estadual, comprovando a nossa eficácia”, disse.
O primeiro lote do sérum rejuvenescedor, com 742 unidades, ficou pronto em outubro de 2020 e está esgotado. Agora, o segundo lote com 700 unidades foi colocado no mercado para comercialização. Soraya comentou que 43% dos compradores do segundo lote são clientes que estão adquirindo o produto pela segunda vez, o que ela considera uma vitória.
Tecnologia limpa
A bióloga Soraya afirmou que, principalmente na área farmacêutica, é preciso atrelar todos os processos de tecnologia. Como os processos bioativos oneram o meio ambiente, a empresa se dedicou a resolver parte desse imbróglio, desenvolvendo uma tecnologia limpa que emite menos de 2% de carbono no meio ambiente.
“Além de o plantio ser feito de forma orgânica, com controle biológico de fungos e bactérias, usamos tecnologia própria e totalmente inovadora de extração dos princípios ativos, o que possibilita o aproveitamento total dos óleos da artemísia, sem uso de solventes tóxicos ou poluentes”, afirmou Soraya.
O único resíduo do processo é a massa vegetal, que está sendo usada para o desenvolvimento de biopolímeros em um projeto já em andamento. Biopolímeros, segundo explicou a pesquisadora, são macromoléculas produzidas por seres vivos, como celulose, amido e quitina. Soraya também afirmou que os resíduos sólidos gerados na extração dos bioativos da artemísia podem ser utilizados como carvão vegetal para a indústria ou na produção de tijolos ecológicos.
A pesquisadora contou que aplica uma tecnologia, conhecida como extração supercrítica, para diminuir a emissão de carbono. “Nas técnicas convencionais, não temos parâmetros, porque existem muitas variáveis, como gasto de energia, água, solventes orgânicos e tudo isso impacta na quantidade de carbono emitido. Com a nossa tecnologia, emitimos menos de 2%”, exemplificou.
A sustentabilidade, destaca, envolve aspectos ambientais, mas também sociais e econômicos. Segundo ela, é importante fechar esse ciclo com produtos orgânicos, limpos, eficazes em suas funções e com custo acessível aos consumidores. “Em uma pesquisa com 50 consumidoras, 80% constataram diminuição de rugas e acnes; 90% notaram menor oleosidade na pele; e 100% disseram ter percebido melhora na textura, luminosidade, hidratação e maciez da pele”, comemorou.
Segundo Soraya, vários outros estudos mostram a preferência do consumidor por cosméticos sustentáveis, o que explica a profusão de propagandas com esse apelo. “No entanto, produtos com ingredientes naturais em suas fórmulas não são necessariamente sustentáveis. É preciso que as matérias-primas e todo o processo de fabricação não gerem qualquer impacto ao meio ambiente, incluindo as embalagens, que devem ser recicláveis”, afirma.
Novos desafios
Em 2021, a startup recebeu o apoio da Biotech Town, Eretz Bio e Senai Inovação. O desafio de Soraya se concentra, agora, em escalar mercado e tecnologia. Ainda que o caminho seja longo, a empreendedora não desanima. “É possível explorar os diferentes compostos da artemísia, criando produtos para aplicações diversas, como repelentes, cicatrizantes, antiacne e até um spray antiviral. Ou seja, essa seletividade resulta em produtos mais eficazes e seguros do ponto de vista farmacológico. Empreender é investir nosso tempo e dinheiro hoje para colher os frutos no futuro”, contou.
Ela busca novas parcerias para seguir com os testes do gel nasal contra a covid-19, ao mesmo tempo em que trabalha para ampliar a negociação com empresas no modelo B2B. “Alcançamos resultados inéditos para um produto natural, com inibição de 99,9% do vírus da covid-19. Ainda estamos na fase pré-clínica e temos um longo desafio pela frente”, disse. O custo desse desafio é avaliado por Soraya em R$ 5 milhões. Esse é o valor para a realização dos testes necessários para a aprovação do novo produto antiviral.
A empresária campineira, em outubro do ano passado, foi a vencedora do Prêmio Empreendedor do Ano da Unicamp, anunciado no 16º Encontro Anual Unicamp Ventures. Ela também foi premiada pela 100 Open Startups e Prêmio Socioambiental.