Sistema híbrido propõe melhor aproveitamento da energia solar  

Homem, cabelos grisalhos, veste camisa azul e mexe em equipamentos de pesquisa

Tecnologia desenvolvida pela Unicamp com patente concedida pelo Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI) propõe a melhora do aproveitamento da energia solar com uso da radiação não utilizada pelas células solares para auxiliar no aquecimento de água

Texto: Caroline Goetten | Foto: Pedro Amatuzzi

A crise energética no Brasil sinaliza a necessidade urgente de novas soluções para geração de energia. De acordo com as informações do Sistema de Informações de Geração (SIGA) da Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL), até outubro de 2021, a capacidade de geração elétrica no Brasil foi composta significativamente por fontes renováveis (82,69%), sendo apenas 2,14% de energia solar. Nesse cenário, onde há espaço para inserção de novas tecnologias, os pesquisadores do Instituto de Física “Gleb Wataghin” (IFGW) da Unicamp desenvolveram um sistema híbrido que responde a esta demanda por alternativas mais sustentáveis. 

A ideia é criação do professor Newton Frateschi e do pesquisador Arthur Vieira de Oliveira, do campo da Fotônica, que sugerem o melhor aproveitamento da energia fotovoltaica por meio de um dispositivo integrado, com especial aplicação em indústrias. Ele possibilita o aquecimento de fluido e geração fotovoltaica com aumento de eficiência de cada elemento do sistema, de forma complementar e inovadora, com melhor proveito da energia solar, tão importante neste momento. 

“O principal ponto de partida para esta patente é o gasto excessivo de eletricidade que se emprega no Brasil para aquecimento de água”, avalia o professor. “Da maneira como acontece hoje, utiliza-se a mesma fonte de energia capaz de sustentar a atividade de um computador, ou de processos complexos e sofisticados, para a tarefa mais trivial possível do uso de eletricidade que é o aquecimento de água. A ideia é ter um sistema que gere eletricidade por conversão fotovoltaica acoplada a um sistema de aquecimento direto de água”, descreve. 

Boa parte da energia solar que incide nas células fotovoltaicas não é aproveitada para tal conversão, sendo refletida e desperdiçada. Na proposta, o arranjo de placas fotovoltaicas é tal que esta energia refletida é levada a incidir sobre sistemas diretos de aquecimento de água, provendo geração de energia elétrica e o aquecimento simultaneamente. Mais ainda, como a água antes do aquecimento é feita passar sob as células fotovoltaicas, estas se tornam mais eficientes por serem resfriadas, particularmente quando o fluxo de água necessário é alto, tal como em geral demandado por vários setores da indústria ou mesmo hotéis ou grandes instalações.

Complemento na geração de energia

“Enquanto na Europa e nos Estados Unidos o uso da energia fotovoltaica já está bem mais estruturado e sistemas elétricos de aquecimento de água menos utilizados, no Brasil ainda encontramos muitos sistemas elétricos para aquecimento de água, apesar de já se observar muitos lugares contando com sistemas de aquecimento solar direto de água, mas ainda baixa presença de painéis fotovoltaicos”, compara o professor Frateschi. 

Uma vez que os sistemas de aquecimento direto solar de água e os sistemas fotovoltaicos disputam os mesmos espaços para a exposição ao sol, é importante ter uma solução que não privilegie a geração fotovoltaica para esta ser depois perdida para o aquecimento de água. Nesta proposta, o sistema híbrido provê exatamente uma possível solução para combinar os dois sistemas em uma forma eficiente e sustentável de geração de energia elétrica e aquecimento de água em forma complementar, resultando, portanto, numa melhor exploração da energia.

A tecnologia inova ao desenvolver um sistema que acopla de forma simultânea os aquecedores de água e as células fotovoltaicas dentro de uma mesma estrutura. Esta estrutura então pode ser instalada tal como já se realiza tipicamente para conversores fotovoltaicos ou aquecedores de água com a vantagem de oferecer complementarmente o aquecimento de água. 

Mais ainda, nos casos de uso industrial, hotéis, ou grandes instalações, onde a demanda de água aquecida é maior, o sistema se mostra mais eficiente porque conta com um fluxo de água fria de entrada que resfria a parte fotovoltaica do sistema aumentando sua eficiência. 

“Nesta patente verifica-se que é possível combinar os componentes de maneira direta, de tal forma que a energia elétrica utilizada no conversor fotovoltaico não seja gasta em seguida para geração de calor. Tudo se produz e se aproveita dentro de um mesmo sistema híbrido”, explica o professor.

Segundo Frateschi, a patente pode ser utilizada em aplicações domésticas, mas apresenta mais vantagens quando aplicada em grandes instalações, onde exista uma elevada demanda de água quente, como fábricas e hotéis. “Quanto mais água fresca entra no sistema, mais aumenta a eficiência das células fotovoltaicas. Com um só sistema é possível aquecer água e gerar eletricidade ao mesmo tempo”, pontua.

A inovação é especialmente vantajosa porque, além de gerar energia elétrica a partir da luz do sol de modo mais eficiente, e que se torna aplicável para determinados processos, pode simultaneamente aquecer grandes volumes de água. A energia solar se torna mais bem aproveitada. “Assim conseguimos reservar a eletricidade para atividades mais nobres e ainda obter água quente, sem necessidade de energia elétrica para aquecimento”, descreve Frateschi.

Energia solar e crise energética

O pesquisador considera importante pensar na eletricidade como uma joia, que acaba sendo desperdiçada em processos para os quais já existem soluções mais simples. “Esta patente propõe um sistema completamente sustentável, do ponto de vista ambiental e, também, comercial e econômico”. Em relação à placa solar que é construída em separado do sistema de aquecimento de água, a estrutura acoplada apresenta um percentual de eficiência de 15 a 20% maior.

A Agência Inova da Unicamp entrou com pedido da patente em 2010, que já foi concedida pelo Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI) e está apta a ser licenciada por empresas que desejem seu desenvolvimento e exploração comercial.

A crise energética é um problema global, sobretudo no Brasil, onde é considerada a pior em 90 anos. A falta de chuvas, as mudanças climáticas e o alto consumo levaram os reservatórios das usinas a níveis muito baixos. “Utilizar energia renovável é fundamental. Não existe forma de gerar energia elétrica sem causar problemas, sobretudo no atual panorama de consumo. Mesmo as hidrelétricas causam distúrbios severos ao meio ambiente”, justifica o professor. 

“Existem alternativas, e dentre elas, a energia fotovoltaica é a mais aplicável. Agora, não faz mais sentido transformar energia elétrica em calor quando este pode ser obtido também da energia solar. Isso é um desperdício tremendo”. Do ponto de vista da sustentabilidade, os investimentos na fonte solar podem exercer contribuição de impacto para o futuro ambiental do planeta.

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Carolina Goetten é graduada em Comunicação Social, com habilitação em Jornalismo, mestre em Linguagem e Tecnologia e bolsista Mídia Ciência (Fapesp).

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