Equipamento desenvolvido na Unicamp integra extração e análise automatizadas de compostos naturais

O sistema bidimensional monitora e fornece a análise cromatográfica, uma espécie de “impressão digital” das substâncias em tempo real e pode ser usado desde bioprospecção até purificação de extratos

Texto: Ana Paula Palazi | Foto de capa: Arquivo Mauricio Ariel Rostagno

A extração de compostos bioativos – fonte de uma ampla gama de substâncias químicas com propriedades interessantes para a sociedade, que vão desde prevenção de doenças até solução de problemas de engenharia -, pode ser muito mais eficiente do que é hoje. Isso porque pesquisadores da Faculdade de Ciências Aplicadas (FCA) e da Faculdade de Engenharia de Alimentos (FEA) da Unicamp desenvolveram um sistema bidimensional que integra várias etapas do processo num mesmo equipamento. 

O sistema avançado e ultrarrápido é capaz de extrair, fracionar e analisar amostras complexas, sejam sólidas ou líquidas, para a determinação de compostos naturais de forma automatizada e com monitoramento em tempo real.

“O sistema representa um grande avanço para a Unicamp. Trata-se de uma planta piloto bem mais complexa do que existe atualmente no mercado”, comenta a docente Tânia Forster que participou da invenção. 

O pedido de patente da tecnologia foi depositado com o apoio da Inova Unicamp no Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI) e está disponível para licenciamento por empresas e instituições interessadas. O novo equipamento foi construído com financiamento do Projeto Jovem Pesquisador, da Fapesp – uma modalidade de apoio à pesquisa que busca fomentar novos grupos de pesquisadores ou novas linhas de pesquisas –  e já está sendo usado em diversos trabalhos científicos da Universidade. As pesquisas também renderam artigos científicos, um deles foi publicado recentemente na revista Analytica Chimica Acta.

Aplicações diversas

O sistema bidimensional foi idealizado originalmente para ser utilizado em escala laboratorial dando suporte para o ensino e a pesquisa na Unicamp. Mas a tecnologia também pode ser explorada para diferentes aplicações. Ela apresenta grande potencial para a indústria, na purificação e concentração de compostos bioativos de alto valor agregado, para produção de extratos e substâncias químicas puras ou para a bioprospecção – esforço empreendido na busca de novos produtos ou processos a partir da biodiversidade local. 

A análise de compostos químicos pode ser feita em diversos tipos de amostras como alimentos, solos, resíduos industriais, fluidos e tecidos animais, entre outros.

“Estamos integrando detecção, análise e separação dentro de uma unidade super automatizada e complexa que nunca ninguém fez. Estivemos, recentemente, num congresso de tecnologia supercrítica e não vimos nada parecido. É uma tecnologia muito impressionante”, resume Forster sobre o novo equipamento em uso na Unicamp. 

Outro campo de pesquisa que pode ser beneficiado pelo invento é o da biorrefinaria. Dando destinos mais nobres e tecnológicos aos resíduos da indústria de alimentos e de bebidas. A ideia é, num futuro próximo, integrar o sistema de forma que após a extração dos compostos bioativos, os resíduos sólidos ainda sejam reaproveitados para a produção de bionergia. 

Leia também: Resíduos da indústria de alimentos podem servir para produção de bioenergia e novos materiais 

Como funciona o sistema bidimensional?

O docente Mauricio Ariel Rostagno que é um dos inventores da tecnologia lança mão de uma comparação barista, com o preparo de um café, para explicar como o equipamento funciona. Segundo o pesquisador, existem várias formas de extrair a bebida no dia a dia. Em resumo, é preciso moer o grão, esquentar a água, escolher o tipo de filtro e coar o líquido.

“Nosso sistema bidimensional é como se fosse a máquina expressa dos cafés”, compara Rostagno sobre o novo sistema automatizado de extração e análise de compostos. 

O equipamento consegue obter frações selecionadas, ricas em substâncias como polifenóis, e com pouca contaminação entre elas. “O interessante é que conseguimos juntar um sólido químico, o qual se liga nos compostos, e isolar, por exemplo, só a cafeína”, diz. Seguindo a analogia do pesquisador, é como se a máquina expressa de café pudesse preparar bebidas diferentes a partir do mesmo pó de café. O benefício de tal sistema é ser integrado, ou seja, otimiza o tempo, etapas e custos, tornando mais simples análises complexas, com objetivo de se obter análise e caracterização da composição química de matérias-primas naturais. 

A equipe de Rostagno pesquisa, principalmente, compostos com atividade antioxidante, anti-inflamatória e anticancerígena. “Para estudar a composição química desses compostos, o sistema é perfeito”, avalia. Todo o processo é integrado a um software e a programação é feita no computador. Diversos produtos já foram analisados como o próprio café, chá mate, bagaço de maçã e frutas cítricas, em pesquisas que estão em andamento na Unicamp. 

Mais controle na extração e análise

 

O sistema bidimensional desenvolvido na Unicamp simplifica análises complexas de matérias-primas e pode ser usado para bioprospeção. 

Modelo 3D do sistema bidimensional em funcionamento no Laboratório Multidisciplinar em Alimentos e Saúde (LABMAS) da Unicamp

 

O sistema bidimensional é composto por duas partes. A primeira faz a extração e purificação (onde a amostra é colocada). A segunda faz a quantificação e identificação dos compostos, presentes no material escolhido, a partir de análise química por cromatografia. O grande diferencial da invenção está na combinação de mais de uma técnica de preparação de amostras que permite realizar a separação de forma simultânea ao processo de extração. 

O sistema também aceita diferentes tipos de solvente como água, etanol, líquidos pressurizados e fluídos supercríticos – termo usado quando a substância é colocada em temperatura e pressão acima do estado natural. Outro ganho com a invenção está no monitoramento em tempo real. Pequenas frações do extrato são coletadas, filtradas e analisadas ao longo do processo, dessa forma, o equipamento gera o perfil bidimensional dos compostos presentes na amostra. A partir desse perfil os pesquisadores conseguem ver a curva cinética e saber quando a extração chegou ao fim. 

“Do ponto de vista analítico, conseguimos fazer uma análise compreensiva, ou seja, identificamos 100% do que tem na amostra”, explica Rostagno.

Em outros equipamentos a amostra só é analisada ao final. De acordo com o pesquisador, isso exige o uso de mais insumos e arrasta o tempo de extração, pois o procedimento acontece às cegas. Para evitar problemas de entupimento e despressurização na fase da filtragem, comuns nesses tipos de equipamentos, os inventores incluíram mecanismos que são acionadas de acordo com o programa e fazem o controle em caso de obstrução.

O uso de métodos rápidos de análise cromatográfica, por meio de colunas de núcleo sólido e condições otimizadas de temperatura, solvente e fluxo, são apontadas como outras vantagens do sistema.

“Reduzimos tempo, porque sabemos quando parar o processo, e também a ocorrência de erros. Como tudo é automático, não é preciso ficar manipulando válvulas e solventes”, complementa.

Além do professor Maurício Rostagno e da professora Tania Forster, a tecnologia foi desenvolvida com o apoio dos alunos de pós-graduação, Mariana Corrêa De Souza, Laise Capelasso Da Silva, Jaísa Oliveira Chaves, Francisco Weshley Maciel Silva e Vitor Lacerda Sanches.

Saiba mais

Para mais informações sobre o perfil desta e de outras tecnologias da Universidade Estadual de Campinas acesse o Portfólio de Patentes e Softwares da Unicamp. Empresas interessadas no licenciamento podem entrar em contato com a Inova na área Conexão com Empresas. O Relatório Anual completo da Agência de Inovação está disponível para download e consulta. Baixe também a Revista Prêmio Inventores e leia mais reportagens sobre patentes concedidas e tecnologias licenciadas da Unicamp.

Política de uso de conteúdo

A reprodução parcial ou total de reportagens, fotografias e imagens é livre, desde que não haja alteração do sentido original do conteúdo e mediante a citação da Agência de Inovação Inova Unicamp, assim como o(s) nome(s) do(s) autore(s) e do(s) fotógrafo(s), quando citado(s). Ex.: “Nome do fotógrafo/repórter - Inova Unicamp”. O mesmo deverá ocorrer no caso de reprodução parcial ou total de arquivos em vídeo ou áudio produzidos pela Inova Unicamp.