11 de março de 2021 Bioplástico desenvolvido na Unicamp pode ser matéria-prima para descartáveis mais sustentáveis
A tecnologia, que já tem patente concedida, está disponível para licenciamento e é uma das alternativas para adaptação de empresas à lei que proíbe a distribuição de descartáveis na cidade de São Paulo.
Texto: Karen Canto
Desde o início do ano, estabelecimentos comerciais da cidade de São Paulo não podem distribuir utensílios descartáveis, tais como copos, pratos e talheres, produzidos a partir do plástico tradicional. A medida – que ainda precisa de regulamentação do prefeito Bruno Covas – abre espaço para que empresas adotem tecnologias mais sustentáveis e fiquem com os dois pés na tão comentada economia circular. No rol das opções que substituem o plástico tradicional na produção de descartáveis está um plástico biodegradável produzido a partir do amido e da gelatina, que foi desenvolvido na Faculdade de Engenharia de Alimentos (FEA) da Unicamp, a partir de estudos conduzidos pelo pesquisador Leonard Sebio e pelo professor Yoon Kil Chang.
Batizado como Amidoplast, o bioplástico teve sua patente concedida junto ao Instituto Nacional de Propriedade Industrial. A Agência de Inovação Inova Unicamp é o órgão da Universidade responsável pela negociação da patente junto a empresas interessadas em adquirir a tecnologia. “Nosso time de parcerias já possui bastante experiência na negociação com empresas que buscam tecnologias mais sustentáveis. Uma boa parte do portfólio de tecnologias desenvolvidas na Unicamp tem esta característica”, afirma Iara Ferreira, diretora de parcerias da Inova Unicamp.
Características e produção do bioplástico Amidoplast
Enquanto um plástico comum leva 250 a 400 anos para se decompor na natureza, a tecnologia desenvolvida na FEA apresenta dupla vantagem. Além de ser um material biodegradável naturalmente, com uma média de degradação de 0,25g ao dia, o Amidoplast tem como base uma matéria-prima abundante e disponível na natureza.
“O amido é uma fonte renovável e de baixo custo, obtida principalmente de cereais, raízes e tubérculos, o que torna esse material ainda mais promissor”, avalia Sebio.
Já o desenvolvimento do produto foi feito a partir do mesmo processo de extrusão que ocorre nas indústrias de plástico, todavia com adaptação: a vitrificação do amido por extrusão termoplástica de dupla rosca. O inventor explica que por meio de tratamento termomecânico a alto cisalhamento e umidade, o amido é transformado em um material termoplástico, amorfo e com aspecto de vidro.
“Quando esse amido vitrificado é posteriormente misturado a outros polímeros biodegradáveis, como biopoliésteres, ocorre a formação de uma blenda que pode então ser empregada na produção de utensílios descartáveis biodegradáveis”, relata Sebio.
Para o pesquisador, o uso dessa tecnologia permite que se chegue a um ponto ideal de vitrificação do amido, o que garante a formação de uma blenda homogênea. “Essa homogeneidade é uma característica fundamental para a qualidade do bioplástico formado, melhorando seu desempenho e biodegradação”, avalia.
Empresas interessados em licenciar esta tecnologia ou outras desenvolvidas na Unicamp podem entrar em contato com a Agência de Inovação Inova Unicamp por meio do formulário de Conexão com Empresas, lançado durante a pandemia para facilitar o contato com o setor empresarial: https://www.inova.unicamp.br/conexao_empresa/#/
Esta e outras tecnologias da Universidade estão divulgadas no Portfólio Online de Patentes e Software, onde é possível fazer uma busca ativa por palavra-chave e conhecer diversas tecnologias disponíveis para licenciamento: https://patentes.inova.unicamp.br/
Sobre a Lei 17.261
A Lei 17.261, que entrou em vigor em janeiro de 2021, proíbe a distribuição por estabelecimentos comerciais dos produtos conhecidos como plástico de uso único na cidade de São Paulo. “Há uma grande expectativa pelo aumento do interesse por materiais biodegradáveis que se apresentem como alternativa aos plásticos de uso único, cuja distribuição foi proibida pela nova lei”, diz Leonard Sebio. Além de não serem mais oferecidos em bares e restaurantes, a distribuição de descartáveis também está proibida em eventos culturais e esportivos de qualquer espécie. No lugar do plástico, os estabelecimentos comerciais devem fornecer produtos em material biodegradável, compostável ou reutilizável que permitam a reciclagem e possam impulsionar a transição para uma economia circular.
As punições previstas envolvem multas que podem chegar a oito mil reais e fechamento administrativo do estabelecimento em casos de reincidência. Os comerciantes que até então forneciam esse tipo de produto aos clientes, agora precisam se adequar à nova realidade, aumentando assim a demanda por opções ecológicas e sustentáveis. “O maior desafio será organizar no Brasil uma cadeia de suprimento para atender a grande demanda por plásticos biodegradáveis e compostáveis em potencial, haja visto que no cenário atual o mercado brasileiro dispõe de estruturas industriais altamente limitadas no setor de bioplástico biodegradável.” Explica Sebio.
A lei que proíbe a distribuição de produtos descartáveis soma-se a lei 17.110 de julho de 2018 que proibiu o fornecimento de canudos plásticos em todo o estado de São Paulo e é mais uma iniciativa para a completa eliminação do uso de plástico não biodegradável em utensílios destinados ao manuseio e acondicionamento de alimentos para o consumo.
Karen Canto é graduada e mestre em química pela UFRGS, doutora em Ciências pela Unicamp, especialista em jornalismo científico pelo Labjor/Unicamp e bolsista Mídia Ciência (Fapesp).