Pesquisadores da Unicamp desenvolvem teste de parasitos intestinais mais eficaz

Texto por Ana Paula Palazi
Foto por Pedro Amatuzzi

Imagine um mundo onde quase metade da população esteja infectada por organismos que invadem o corpo do hospedeiro, se multiplicam, debilitam a pessoa e podem até levá-la à morte. Os parasitos intestinais são um problema de saúde pública e um desafio para as autoridades sanitárias. O exame parasitológico de fezes é o único nas rotinas dos laboratórios de análises clínicas, público e privado, que ainda é feito de forma totalmente manual, com o uso de técnicas de diagnóstico centenárias, como a sedimentação espontânea que data de 1919, e análises visuais passíveis de erro humano, sobretudo pela falta de conhecimento de todos agrupamentos parasitários e cansaço dos profissionais de microscopia.

Com uma parceria consolidada com a Unicamp há mais de uma década, a startup Immunocamp Ciência e Tecnologia Ltda., empresa coirmã do grupo BioBrasil, têm atuado no desenvolvimento de técnicas mais confortáveis, rápidas e eficazes para o processamento de fezes humanas e de animais que incluem a automatização. O TF-Test (Three Fecal Test) foi a primeira etapa do desenvolvimento. Uma técnica composta por um kit parasitológico mais discreto, sensível e prático para laboratórios e pacientes, já disponível no mercado.

O apoio a estruturação do negócio por meio do processo de incubação da Incubadora de Empresas de Base Tecnológica da Unicamp, e a interação interdisciplinar com a academia – envolvendo diferentes áreas de atuação, bem como, medicinas humana e veterinária, computação, química, biologia e engenharia mecânica industrial – resultou em outras cinco patentes. Todas depositadas junto ao Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI) com suporte da Agência de Inovação Inova Unicamp.

Um dos três licenciamentos mais recentes é um inédito exame parasitológico das fezes. A técnica usa o princípio de Flotação por Ar Dissolvido (FAD). Este procedimento já é usado amplamente em outras áreas, como a mineração, na separação de sólidos e líquidos para extração de ferro, por exemplo, e por empresas de saneamento na área de tratamento de água e esgoto.

O invento consiste em criar uma corrente de microbolhas em meio líquido que suspende e separa os parasitos em uma área de interesse diagnóstico. Com isso, se obtém um material mais limpo, reduzindo as impurezas e os compostos químicos agressivos que podem falsear os resultados. Os pesquisadores já conseguiram mais de 90% de aderência para o agrupamento dos helmintos e cerca de 50% de eficiência com protozoários.

O próximo passo é integrar a tecnologia a um outro sistema patenteado da Universidade, validado em laboratório por meio de um projeto que recebeu aportes do Programa Pesquisa Inovativa em Pequenas Empresas (PIPE), celebrado em convênio com a Immunocamp Ciência e Tecnologia Ltda e sob a coordenação de Jancarlo. A patente resultada principalmente de duas orientações de doutorado do Dr. Jancarlo faz parte de um Projeto Temático da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP), coordenado pelo docente do Instituto de Computação, Alexandre Falcão O Diagnóstico Automatizado de Parasitos Intestinais (DAPI) é o único instrumento integrado de leitura e diagnóstico parasitológico no mundo capaz de entregar resultados por imagens.

Avanços na saúde pública

Outras duas patentes também criam novos protocolos laboratoriais de fácil execução e bom custo-benefício para adoção nas rotinas dos laboratórios e em programas de saúde pública, permitindo avanços no estudo epidemiológico de dois importantes parasitos endêmicos em regiões tropicais. O TF-Test Coccidia, é baseado no desenvolvimento de um procedimento de concentração e uma composição corante que, aliada à técnica parasitológica já disponível, permite a detecção qualitativa em exames de oocistos do parasito Cryptosporidium spp, causador de uma doença cosmopolita denominada criptosporidíase.

Já o TF-Test Quantified, é específico para a detecção quantitativa de ovos de Schistosoma mansoni, verme causador da doença conhecida como barriga d’água em algumas regiões do país. Os inventores propõem um fator de conversão mais sensível na contagem de Ovos Por Grama (OPG) de fezes, em comparação com as técnicas convencionais de contagem utilizadas em programas governamentais. A esquistossomose atinge 220 milhões de pessoas no mundo e no Brasil, é considerada endêmica e persistente em 19 estados.

Esta técnica, que contou com financiamento de uma bolsa de Mestrado da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), para a aluna Bianca Martins dos Santos, pode ainda estender o diagnóstico qualitativo para as 15 espécies de protozoários e helmintos intestinais humanos mais prevalentes do país, permitindo que programas epidemiológicos tenham acesso à levantamentos parasitológicos completos da população a partir de um único exame.

Com a automatização, os laudos ainda vão poder ser emitidos com a foto do parasito encontrado, aumentando a confiança no diagnóstico.

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